Roberto Brant*
Nunca me acostumarei com o fato de que os problemas essenciais que afligem o país passem longe das agendas da política brasileira. Do mesmo modo não me conformo com a passividade com que a sociedade reage a esta indiferença. Talvez isso seja fruto de uma cultura fatalista e complacente que acha que tudo é como deveria ser e que os homens não tem o poder de mudar o seu destino.
A política brasileira hoje funciona no modo de sobrevivência. A grande maioria dos políticos, estejam eles no Legislativo ou no Governo, tem apenas um único grande desejo, o de manter suas posições no poder. Por isso procuram evitar qualquer grande tentativa de mudança, cujas consequências podem ser rupturas difíceis de prever com clareza. Governos e parlamentos usam todos os meios de que dispõem para promover mudanças triviais e cosméticas, fingindo mudar apenas para que tudo fique essencialmente como está.
A força deste desejo de conservação tem sido capaz de paralisar um gigante que é este nosso país, tão rico de toda a sorte de recursos e povoado por uma gente de muitas origens e, na sua maior parte, criativa, inteligente e trabalhadora. Nos últimos quarenta anos, após nossa sociedade ter atingido um certo nível intermediário de renda e de maturidade, o medo do crescimento e da transformação parece ter sufocado nossas energias.
O Brasil tem hoje uma das maiores taxas de desemprego no mundo, em torno de 14,2%. Este próprio dado oculta certas particularidades que o tornam mais grave. Do total da força de trabalho, além dos desempregados, que somam hoje mais de 14 milhões, temos cerca de 10 milhões que trabalham sem carteira assinada e 23 milhões que trabalham por conta própria, ambos os grupos privados de proteção social.
Todos esses dados mostram como é precária e vulnerável a vida na maioria das famílias brasileiras. Alguém poderá dizer que grande parte deste estado de coisas é devido à pandemia e às medidas de isolamento social que foram adotadas para proteger as pessoas. Infelizmente o que é verdade para muitos países no mundo não é verdade para o Brasil, pois a situação crítica do nosso mercado de trabalho é estrutural e antecede o surgimento da Covid.
Em alguns países a pandemia provocou muito desemprego e pobreza. Nos Estados Unidos antes da Covid havia praticamente pleno emprego, com apenas 4% da população desempregada. No auge da doença o desemprego subiu para 15%. Passados os piores momentos a taxa de desempregados recuou para 6%. No conjunto dos países desenvolvidos a pandemia fez o desemprego saltar de 5%, em média, para 9%, mas os índices agora já estão voltando à normalidade.
No Brasil a situação é muito diferente. Nossas taxas de desemprego e a precariedade do trabalho estavam elevadas há muito tempo. Já em 2018 o desemprego estava em 12,8%. No auge da pandemia, em 2020, a taxa subiu para apenas 13,5% e agora, com a vida voltando aos poucos ao normal, subiu novamente para 14,2%. O alto desemprego no Brasil não é definitivamente o resultado das medidas sanitárias adotadas por Estados e Municípios.
O desemprego no Brasil é uma condição estrutural provocada pelo baixo crescimento crônico de nossa economia. Nosso país há muito tempo mostra grande incapacidade de criar empregos porque não cresce e não investe em novas atividades produtivas.
Não tenho dúvida de que este é nosso problema principal: empregar os brasileiros dispostos a trabalhar e criar condições para que o trabalho por conta própria esteja protegido contra as incertezas da vida econômica. Por isto nossas políticas públicas precisam priorizar o crescimento acima de qualquer outro objetivo. E paralelamente assegurar boa educação para todos, com ênfase na formação técnica das pessoas para que elas atendam às exigências de um trabalho cada dia mais dependente de novas tecnologias.
Se o Estado brasileiro não for capaz de fazer isto, em breve todos os seus recursos serão pequenos apenas para conter as desordens e a raiva de uma população que perdeu todas as suas esperanças.
*Advogado, ex-Deputado Federal, ex-Ministro da Previdência Social
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