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O novo crash global, marcado pela queda das bolsas de valores mundo afora, assinala o desenlace da “segunda onda” da crise internacional, desencadeada pela débâcle do mercado norte americano de hipotecas subprime, cujo ápice se deu com a quebra do banco de desenvolvimentos Lehman Brothers, em 15 de setembro de 2008, a desembocar em pânico em escala mundial. Configura-se, assim, o cenário previsto nesta mesma coluna, na edição do Mercado Comum de julho/agosto de 2010, quando se afirmou que, com a crise grega, iniciava-se a contagem regressiva de nova crise internacional, que inviabilizaria a previsão dos otimistas, que apostavam que a mesma seguiria o V da vitória, ou seja, depois de uma recessão profunda, mas curta, assistir-se-ia a retomada sustentada do crescimento econômico. O pior é que, em razão da hegemonia política do capital financeiro, os governos não estão dispostos a implementar as medidas que retirariam a economia de seu andar de caranguejo, muito menos aquelas que dariam solidez ao sistema bancário.

As raízes do novo crash não são difíceis de identificar. É claro que, antes de mais nada, o novo crash representa, ao fim e ao cabo, uma reverberação da crise internacional, que tornou insustentável, da noite para o dia, a trajetória de endividamento dos PIGS, grupo de países que agrupa Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha. Agravou, de mais a mais, a situação fiscal não apenas dos Estados Unidos, mas também dos países desenvolvidos da Europa, num contexto em que a política monetária foi quase que exaurida no resgate do sistema financeiro, sem que se fizessem as reformas estruturais que garantiriam a sua solidez. Originou, além disso, forte movimento especulativo, que fortaleceu a elevação dos preços das commodities, reforçando, portanto, as pressões inflacionárias oriundas da crise ecológica, às quais se veio somar, de mais a mais, as pressões decorrentes da desconfiança em relação ao dólar. Como se não bastasse, o cenário viu-se agravado pelo terremoto/tsunami no Japão e pelo levante árabe, a impactar desfavoravelmente sobre os preços do petróleo. Isso sem falar na política míope adotada pelos países desenvolvidos, que, atendendo aos interesses do capital financeiro, têm implementado políticas de ajuste fiscal, as quais obviamente agravam a situação, dado seu impacto negativo sobre o nível de atividade econômica. E como se não bastasse, nessa marcha da insensatez, para utilizar a feliz expressão da historiadora norte-americana, Barbara Tuchman, se veio juntar o Partido Republicano, que obstaculizou até a undécima hora, o aumento do limite do endividamento do governo dos EUA, e as agências de classificação de risco, que rebaixaram o grau dos títulos norte-americanos, como se essas ações não lançassem ainda mais lenha na fogueira da insegurança global.

A questão que se coloca hoje, portanto, não é mais se o comportamento da economia mundial seguirá o V ou o W, como era discutido na primeira metade de 2010. O problema, agora, reside em saber a dimensão do estrago causado, principalmente em termos de PIB e desemprego, para não falar nas repercussões do novo pânico, cujos efeitos ainda não se fizeram sentir por inteiro, ou seja, em dimensionar adequadamente o W. De saída, as perdas acumuladas por Wall Street – a bolsa de valores dos EUA – já somam US$ 2,3 trilhões, desde o pico de 22 de julho último, ao que se deve adicionar as perdas dos investidores do resto do mundo. Embora se possa dizer que essa riqueza não é real, na medida em que as máquinas e equipamentos não sofreram com ela, o consumo das classes abastadas é função do valor as ações, assim como os investimentos dos empresários e a disposição dos bancos em emprestar.

E a esse respeito o último pânico fez ressuscitar a fuga para a liquidez, com os bancos reduzindo, uma vez mais, seus créditos, mesmo ao nível do interbancário, enquanto os investidores demandam taxas maiores de juros, para cobrir a elevação do risco. Em particular, os bancos norte-americanos estão cortando suas posições em títulos europeus, tanto em títulos soberanos quanto em títulos privados. Assim, por exemplo, a média mensal de giro de commercial papers europeus declinou de US$ 17 bilhões no mês de julho para somente US$ 8 bilhões em agosto. O interbancário também está sofrendo, ampliando-se o spread entre os títulos do Tesouro norte-americano e as taxas do overnight, o que tem requerido a pronta intervenção do Federal Reserve, Fed, o banco central dos EUA, para evitar a paralisação do mercado. Isso sem falar na aparente fuga dos investidores não apenas dos títulos dos países do PIGS, mas dos próprios bancos que detém esses títulos, que estão perdendo depósitos rapidamente. E esse movimento contra os bancos com maior exposição pode trazer consigo nova quebra bancária, arrastando o sistema para outro ataque de pânico. Aliás, mesmo que isso não ocorra, a fuga dos títulos espanhóis parece indicar que a Espanha é a próxima bola da vez, o que trará novo abalo de grandes proporções.

Em outras palavras, o cenário está por demais tumultuado e certamente as novas ondas de choque não deixarão de causar danos adicionais a um mercado já submetido a forte stress, a demandar pronta atuação das autoridades governamentais. Isso, contudo, está distante das possibilidades do poder estabelecido nos países desenvolvidos, dadas suas raízes nos próprios interesses do capital financeiro, que reluta em soltar os anéis para salvar os dedos. Aliás, isso ficou claro no encontro dos líderes de bancos centrais dos países desenvolvidos em Jackson Hole, Wyoming (EUA), no fim de semana de 27 e 28 de agosto, que, além de deixarem claro que a política monetária sozinha não tem condições de reverter a crise atual, também não deixaram de recomendar aos governos medidas destinadas a se obter o equilíbrio fiscal.

Na verdade, a ambigüidade dos discursos das autoridades monetárias e dos demais convidados à reunião não deixa de ser reveladora. Para começar, o presidente do Fed, Ben Bernanke, reconheceu que “apoiar o crescimento econômico robusto no longo prazo está fora do alcance do banco central”. Nesse sentido, incitou o governo norte-americano a adotar “políticas residenciais favoráveis proativas”, para reverter a recessão do mercado de imóveis, além de advertir os congressistas dos EUA a evitar políticas que poderiam ferir o crescimento no curto prazo. As palavras animadoras de Bernanke, contudo, foram esvaziadas pela sua insistência de que o Congresso deveria adotar “um plano confiável para reduzir os futuros déficits no longo prazo”. Utilizando uma outra moeda, Ewald Nowotny, do Conselho de Governadores do Banco Central Europeu (BCU), afirmou que o governo da zona do euro deveria expandir os recursos do Fundo destinado a bancar o resgate dos países com problemas de dívida soberana, como nos casos da Grécia, Portugal e Irlanda. É bom lembrar que o BCU embarcou numa política de elevação das taxas básicas de juros e Nowotny, apesar da nova crise, não fez qualquer menção em reduzi-la. Na verdade, a posição das autoridades monetárias foi sumarizada pelo diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, quando declarou que “a política fiscal tem de navegar entre dois perigos, perder a credibilidade e solapar a recuperação econômica”.

Em outras palavras, as lideranças dos países desenvolvidos não estão dispostas a abrir mãos das políticas favoráveis ao capital financeiro, a começar pelo equilíbrio fiscal, mesmo diante do agravamento do cenário econômico mundial. Em lugar de expandir o gasto público, como forma de ativar a economia e apoiar operações de swap com “corte de cabelo”, ou seja, de troca títulos de dívida de alto custo por títulos com juros reduzidos e desconto, preferem insistir na política monetária, cujo esgotamento é reconhecido pelos próprios bancos centrais. Só resta saber, pois, em que medida o cenário vai se agravar ainda mais no futuro para que as autoridades econômicas abandonem a marcha da insensatez.

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