Brasil: uma sociedade desigual no tempo e no espaço

Paulo R. Haddad*

Não olhe para os lados

Um grupo de turistas sai de Belo Horizonte em direção a Ouro Preto. Logo no início da BR–040, à sua esquerda, está o Belvedere, um dos mais caros e luxuosos bairros da capital mineira, com índices de desenvolvimento humano (IDH) iguais aos da Suíça e da Noruega (0,951). Do outro lado equivalente da rodovia, está o Morro do Papagaio, com uma população de quase 20 mil habitantes com um IDH (=emprego e renda + educação + saúde) igual a 0,685, semelhante aos índices baixos da África do Sul ou da Índia.

Se você estiver no Estado de Alagoas e viajar na direção do Rio São Francisco, saindo de Maceió, na Zona da Mata, passando pelo Agreste e pelo Sertão do Nordeste, você verá o desenrolar de um cenário dos patamares de pobreza extrema enraizados no espaço geográfico. Se você achar que mora no País das Maravilhas, não olhe para os lados, pois verá que 48,7% da população do Nordeste é de pessoas pobres.

Em 2021, segundo o IBGE, o País passou a ter 62,5 milhões de pessoas (29,4% da população) abaixo da linha da pobreza, incluindo 17,9 milhões de pessoas na extrema pobreza (8,4%); um em cada três brasileiros era pobre em 2021. A pobreza atinge desproporcionalmente crianças até 14 anos (46,2%) e os jovens de 15 a 29 anos (33,2%). E a pobreza no Brasil tem cor e gênero: ainda segundo o IBGE, a proporção de pretos e pardos abaixo da linha da pobreza é de 37,7% e dos domicílios chefiados por mulheres sem cônjuges e com filhos menores (60,08%). 

Não é de estranhar, pois, que, o Brasil tenha voltado ao Mapa da Fome Mundial, em 2022, e mais de 21 milhões de brasileiros se encontram em situação de insegurança alimentar, em 2023.

Em 1919, Keynes, que representava a Inglaterra no Tratado de Versailles no pós-I Grande Guerra, advertia:

“O perigo que nos confronta, portanto, é a rápida depressão do padrão de vida das populações Europeias até o ponto que significa a atual fome para alguns (um ponto já atingido na Rússia e aproximadamente atingido na Áustria). Os homens nem sempre morrem silenciosamente. Porque a fome, que traz alguma letargia e um desespero desamparado, leva outros temperamentos à instabilidade nervosa de histeria e de louca aflição”.

Políticas Sociais Compensatórias: indispensáveis, mas insuficientes

O que fazer quando uma sociedade chega, após uma longa evolução histórica, dividida estruturalmente pelos níveis de renda, de região, de cor, de gênero? Nos últimos anos, desde a Constituição de 1988, a predominância na agenda governamental da redução das desigualdades sociais e regionais de desenvolvimento, tem sido de ações das políticas sociais compensatórias (Bolsa-Família, Lei Orgânica de Assistência Social, Previdência Social) e das transferências fiscais do Governo Federal para Estados e Municípios (FPM, FPE, Fundos Educacionais, Fundos de Saúde Pública, etc.).

É preciso reconhecer que a crise social não assumiu um recorte de pobreza africana por causa das políticas sociais e fiscais compensatórias do Governo Federal, que vieram se estruturando desde os anos 1990. E, também, que os movimentos organizados da sociedade civil mobilizaram várias iniciativas de doações de bens essenciais para os mais necessitados, lembrando que um pouco dos que têm muito pode representar muito para os que têm pouco.

Para Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia em 1998, o desenvolvimento é um processo de criação de oportunidades para que as pessoas possam realizar os seus projetos de vida. Em uma economia de baixo crescimento com ciclos frequentes de recessão econômica, como é o caso do Brasil nos últimos quarenta anos, o processo prevalecente tem sido o de destruição de oportunidades. Segundo o IBGE, a taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos tende a ser superior ao dobro da taxa geral. 

Desse contexto, em que prevalecem taxas abissais no tripé das desigualdades de renda, de emprego e de oportunidades, algumas lições podem ser apreendidas a partir das experiências históricas de diversos países de economias de mercado:

  • As economias de mercado que apresentam melhor desempenho econômico sustentado são as que têm os melhores indicadores de igualdades sociais. 
  • Políticas econômicas que aumentam as desigualdades sociais resultam em menor crescimento econômico. 
  • As economias de mercado que têm piores indicadores de desenvolvimento social sustentável são as economias com pior distribuição de renda e de riqueza, independentemente do seu nível de desenvolvimento.
  • Políticas públicas bem concebidas e implementadas têm a capacidade de reduzir sensivelmente o número de pobres e de miseráveis de um país ou de uma região. 
  • Economias de mercado que se envolveram em processo excessivos e dominantes de financeirização têm os seus níveis do tripé de desigualdades acentuados.
  • As economias capitalistas que progridem mais e melhor sempre realizaram uma inteligente combinação de mercado e governo, de tal forma que não se trata de mercado ou governo, mas de combinar ambos para maior benefício da sociedade, através de processos de planejamento indicativo.

Richard Wilkinson e Kate Pickett, epidemiologistas que têm estudado os problemas de desigualdade e de saúde, demonstraram no seu livro “The Spirit Level”, que quase todos os indicadores de bem-estar social são afetados menos pela riqueza de uma sociedade e mais pelo quanto ela é desigual. E que a vida nas sociedades mais divididas economicamente é pior para todos, inclusive para os mais ricos. 

Em seu livro é apresentado o estudo desenvolvido para a construção de um Índice de Saúde e Problemas Sociais, através de dados sobre problemas sociais: nível de confiança, doenças mentais (incluindo uso de drogas e consumo de álcool), esperança de vida ao nascer e mortalidade infantil, obesidade, desempenho educacional de crianças, gravidez precoce, homicídios, taxas de aprisionamento e mobilidade social. Esse conjunto completo de informações somente estava disponível, à época da pesquisa, para vinte e três países desenvolvidos e para todos os estados dos Estados Unidos. 

Em seguida, procuraram correlacionar os indicadores entre países e entre estados, de um lado, com os níveis de desenvolvimento econômico e, do outro lado, com os níveis de desigualdades sociais. Concluíram que os problemas sociais e de saúde são fracamente relacionados com a renda per capita de países e estados e fortemente relacionados com as suas desigualdades sociais. Por exemplo: os Estados Unidos que são o país com a maior renda per capita (o maior nível de desenvolvimento econômico) apresentam o pior valor do Índice de Saúde e Problemas Sociais entre os países analisados. Em 2007, 1 por cento da população ganhava quase 25 por cento da renda nacional dos Estados Unidos. Os mesmos resultados foram obtidos para quase todos os indicadores, tomados isoladamente, e para todos os estados dos Estados Unidos: problemas sociais e de saúde estão sistematicamente relacionados com as desigualdades sociais. 

Desde os anos 1960 e 1970, o Brasil vem executando, com relativo sucesso, políticas públicas de desenvolvimento socioeconômico e socioambiental, iniciadas num período em que o Governo Federal chegou a ter superávits primários superiores a 5% do PIB, no início dos anos 1970, e as empresas estatais a dispor de 80% de recursos próprios para o financiamento dos seus projetos de investimentos. Com a atual crise fiscal dos três níveis de governo houve uma exaustão do modelo de crescimento liderado pelo Poder Público e uma desmobilização, em termos de eficácia, das políticas sociais, ambientais e regionais.

Os eventos portadores de mudanças neste século 21 têm sido tão intensos que não podemos apenas continuar reproduzindo políticas de um passado, ainda que glorioso. As políticas públicas em todos os seus níveis têm que se transformar e renovar ainda que num ambiente de incertezas pois, quando as lideranças se responsabilizam pelo bem-estar social sustentável de uma nação, há riscos que não podemos deixar de correr. Como dizia Keynes, a dificuldade não reside nas novas ideias, mas em conseguir escapar das antigas.

Afinal, o próprio Keynes dizia que o capitalismo somente poderia encontrar legitimidade se as pessoas de rendas mais modestas continuassem a acreditar que as pessoas mais ricas mereciam sua sorte graças às suas contribuições para a sociedade, e não graças à especulação e ao roubo.

*Mestre em Economia, ex-ministro da Fazenda

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