Reformas? Que reformas? Quaisquer que sejam não virão por agora
Reformas? Que reformas? Quaisquer que sejam não virão por agora
Reformas? Que reformas? Quaisquer que sejam não virão por agora

 

Mozart Foscheti[1]

Enfim, Lula assumiu sem maiores problemas seu 3º mandado como Presidente da República. Se há algo de estranho nisso é a percepção de que um sujeito de origem humilde, oriundo lá da longínqua Garanhuns, em Pernambuco, superando todas as adversidades possíveis e imagináveis, inclusive uma condenação pela Justiça por alta corrupção, voltou a ocupar a cadeira de máximo dirigente do País. Algo só possível neste Brasil onde a interpretação e a aplicação da lei se sujeitam aos ventos do momento.

E, pelo visto, ele está vindo em nome da esperança e de mudanças que tragam a todos um novo Brasil, um Brasil melhor, mais otimista, mais unido, mais desenvolvimentista, com menos pessoas pobres e com ninguém passando fome.

Mudanças certamente virão, mas não necessariamente as de que o País precisa. Haverá, sem dúvida, mais programas de assistência social (necessários) e mais estatizações (um retrocesso). Também se sabe que haverá uma gastança desenfreada, sem maiores compromissos com a política fiscal. Como todo político de esquerda, Lula imagina que o Estado é um grande guarda-chuva que a todos assiste, uma fonte inesgotável de recursos, venham eles de mais impostos, de novos endividamentos e até mesmo de emissão monetária. Isso não importa.

Mas, reformas que é bom, não virão. E não virão não só porque o Lula não as quer. Elas certamente não virão – como não vieram nos quatro governos petistas anteriores – principalmente porque não é fácil fazer reformas em nenhum país do mundo. No Brasil, muito menos, um país cheio de feudos, de corporações, de ilhas da fantasia, onde quem, merecendo ou não, já conquistou suas regalias e seus privilégios se tornou suficientemente forte para impedir qualquer reforma que poderia levar o País à modernização e ao crescimento gerador de emprego e de renda.

O que é difícil em outro país, no Brasil é potencializado. A necessária reforma tributária que, além de simplificar um pouco o mais emaranhado e complexo sistema tributário do mundo, taxasse os dividendos e as heranças, já foi tentada algumas vezes e sempre fracassada por razões óbvias.

A reforma política que reduzisse a um máximo de cinco os partidos políticos – tornando o País mais governável – não virá porque contraria o interesse de todos os políticos. Não é à toa que se advoga a tese de que a reforma política e as leis eleitorais são leis que não deveriam ser processadas no Congresso Nacional. Do jeito que está hoje, é o mesmo que colocar o rato como juiz na partilha do queijo.

Faz-se necessária uma reforma administrativa que padronizasse as regras (não os valores) e impusesse limites remuneratórias a todas as classes e categorias de servidores públicos, incluindo no cálculo desses limites os “penduricalhos” salariais cuja criação e expansão sob diversos pretextos é uma especialidade do Poder Judiciário e de categorias a ele ligadas como a dos procuradores, promotores, advogados da União e dos Estados. Essa reforma administrativa jamais será feita – não, pelo menos, num sistema democrático – pela objeção do Poder Judiciário (de todos o mais privilegiado) e das Forças Armadas – duas categorias que se julgam castas diferenciadas. E que não se advogue um regime de exceção para que as reformas possam ser feitas. Seria o mesmo que matar o doente para curar sua doença.

De outra parte, há que se registrar o fenômeno da judicialização da política econômica e o cada vez maior ativismo político dos juízes das mais altas Cortes, seja emitindo opiniões em público sobre problemas políticos, seja atuando partidariamente. Qualquer medida do Poder Executivo ou leis aprovadas no Parlamento que contrariem o interesse de algum grupo econômico ou político são levadas à justiça e por ela acatadas – o que engessa o exercício do Poder. O que se propõe é algo simples e quase óbvio: que nossa Corte Suprema se limite a cuidar das leis ou de atos governamentais cuja constitucionalidade é questionada e interferir o mínimo possível nas decisões do Poder Executivo. Dever-se-ia também criar-se mecanismos que iniba o ativismo político dos membros das Instâncias Superiores da Justiça de modo a torná-los mais isentos e mais imparciais nos seus julgamentos. Em síntese, o que se propõe é que se reduza ao máximo a judicialização da política econômica e a politização do judiciário.

Há ainda que se considerar como dificuldades adicionais para a introdução de reformas modernizantes o nosso sistema legislativo bicameral, o tamanho territorial e a existência de inúmeros Estados, cada um com suas características e necessidades próprias. Reformas são mais fáceis num país pequeno e com apenas um governo central.

Ademais de tudo isso, reformas seriam mais facilmente introduzidas num país onde houvesse mais coesão social – coisa de que o Brasil hoje é especialmente carente. O “nós” contra “eles” nunca esteve tão presente como agora. Antes, dizia-se que a “esquerda” era organizada em suas ações políticas. Agora, a direita também está se organizando e o resultado disso é o aumento da possibilidade de conflitos sociais.

Não, o País não fará as reformas de que necessita. Com uma classe rica míope e egoísta, aliada a um Poder Judiciário politicamente ativista e a uma classe política corrupta como a nossa, não haverá reformas. E não as havendo, o País vai continuar patinando por uns bons tempos, correndo o risco de perder o bonde da história. E, em sendo assim, a classe mais pobre continuará sobrevivendo com as migalhas que caem da mesa dos ricos e com as “sobras” dadas pelo governo de plantão. Pobres são e pobres continuarão.

E así la nave va!

(Nota: Algumas ideias deste texto foram tiradas de um artigo publicado há algum tempo no Caderno “Ilustrada” da Folha de São Paulo. Os nomes dos autores não foram lembrados). 

[1] Mestre em Economia pela University of Kent, Inglaterra. Professor aposentado.

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