Zema sanciona artigo 23 da Lei Federal Complementar 178 e ainda insiste na adesão do Estado ao Regime de Recuperação Fiscal
O governador de Minas Gerais, Romeu Zema sancionou, no dia 20 de junho, o projeto de lei estadual que permite ao estado aderir ao artigo 23 da Lei Complementar Federal 178, de 2021, o que possibilita renegociar cerca de R$ 31 bilhões em dívidas com a União. A medida, aprovada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), por meio do Projeto de Lei (PL) 3.711, de 2022, foi considerada um passo inicial pelo governador, que defende a necessidade de adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) para equilibrar as contas do Estado, a médio e longo prazos, sem comprometer a prestação de serviços. A adesão ao artigo 23 em conjunto com o RRF reduziria os desembolsos para quitar a dívida com a União em R$ 12 bilhões entre 2022 e 2023.
O projeto de lei que trata da adesão ao RRF (PL1.202/2019) está na ALMG desde 2019, mas ainda não foi levado para votação no plenário.Alega o governador Romeu Zema, ao sancionar o artigo 23, que a nova lei é interessante para o Estado, mas não será a solução para as dívidas com o governo federal. Segundo ele, “esse é o primeiro passo, mas insuficiente para resolver o problema de caixa do Estado. É uma solução parcial, mas necessária, porque, a qualquer momento, as liminares obtidas junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) podem cair. Sem elas teríamos que quitar R$ 31 bilhões não pagos desde junho de 2018, além de mais de R$ 9 bilhões em juros e multas”, explicou Zema. Cabe destacar, no entanto, que o governador Zema assumiu o governo em 1º de janeiro de 2019 e, portanto, a parcela mais expressiva dos R$ 31 bilhões em inadimplência junto à União ocorreu durante o seu mandato
Com a adesão ao artigo 23, o Governo de Minas fica isento de pagar cerca de R$ 9 bilhões em juros e multas, podendo parcelar, ademais, os R$ 31 bilhões em 360 vezes. No entanto, fica dispensado de privatizar as suas empresas estatais, principalmente a Cemig, Copasa ou a Codemig. De outro lado, com ao artigo 23, Minas Gerais é obrigado a suspender as ações de não pagamento das dívidas e, desta forma, o governo precisará pagar R$ 4,83 bilhões ainda durante o exercício de 2022. Para o próximo ano, 2023, o pagamento subiria para R$ 10,9 bilhões, valor que será pago até 2031. Vale ressaltar, de outro lado que, com a Selic em 13,25% ao ano, apenas a título de juros incidindo sob o montante de uma dívida de R$ 140 bilhões, o estado passará a ter um dispêndio mensal na ordem R$ 1,5 bilhão.
Segundo Zema, a aprovação do projeto para adesão ao Regime de Recuperação Fiscal é essencial para o Estado e iria permitir uma melhor equalização dos pagamentos. Além disso, o governador explicou que aderindo ao Regime de Recuperação Fiscal, o governo pagaria, entre 2022 e 2023, R$ 12 bilhões a menos.
Caso o Estado aderisse ao artigo 23 e também ao Regime de Recuperação Fiscal, em 2022, Minas teria que pagar ao governo federal R$ 900 milhões e não os R$ 4,8 bilhões a serem pagos somente com a adesão ao artigo 23. Em 2023, o pagamento seria de R$ 2,7 bilhões e não os R$ 10,9 bilhões previstos somente com o artigo 23. As parcelas aumentariam gradativamente ano a ano até chegar a 2031 ao valor de R$ 13,8 bilhões.
“Temos uma gestão de gastos muito responsável, mas corremos o risco de inviabilizar o futuro dos 21 milhões de mineiros e mineiras. A adesão ao RRF é que vai possibilitar a manutenção dos serviços primordiais para a população, como funcionamento dos postos de saúde, hospitais, segurança e escolas. É uma diferença de mais de R$ 12 bilhões em dois anos. É uma situação muito complexa”, disse Zema.
‘Risco de insolvência’
O principal argumento do governo Zema para a tramitação em regime de urgência do projeto de lei que autoriza o Estado a aderir ao Regime de Recuperação Fiscal é a ameaça de queda das liminares no STF, já que estão condicionadas à adesão do Estado ao RRF, uma vez que o STF lhe intimou sobre a necessidade de ações concretas do Estado para a adesão ao regime.
A iminência da queda da liminar coloca o Estado sob o risco de insolvência fiscal, uma vez que, caso isso ocorra, o Executivo estadual teria que desembolsar R$ 31 bilhões em um único pagamento. Essa situação comprometeria inclusive a manutenção da prestação de serviços de saúde, educação e segurança”, alega.
O secretário de Estado da Fazenda, Gustavo Barbosa, reforçou o posicionamento do governador. “Somente o artigo 23 não é suficiente para equacionar a dívida do Estado. O Regime de Recuperação Fiscal continua necessário para não termos um desequilíbrio das contas no médio e longo prazo”, explicou.
Acrescentou o governador Zema que o projeto para adesão ao RRF está parado na ALMG desde 2019. “Em 2019, há mais de três anos, enviamos um projeto à ALMG pedindo autorização para adesão ao Regime de Recuperação Fiscal. O objetivo é negociar com a União uma forma melhor de equacionar o pagamento da dívida. Até hoje, por não ter entendido a proposta ou por medo de ser aprovada se colocada em pauta, o presidente da ALMG não levou, sequer, o projeto a plenário para votação. Os deputados de Minas nem mesmo tiveram a chance de opinar”.
Montante pode quitar a folha da Educação
A secretária de Estado de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto, mostrou o que é possível ser custeado com os R$ 10,9 bilhões que serão destinados para o pagamento da dívida em 2023.
Segundo ela, com o valor é possível pagar 100% da folha de pessoal da Secretaria de Educação por um ano, restando ainda cerca de R$ 1 bilhão. O recurso também seria suficiente para financiar 75% de todas as despesas que Minas Gerais executa com Manutenção e Desenvolvimento do ensino.
Os R$ 10,9 bilhões correspondem a um ‘ano e quatro meses de todas as despesas que o Estado de Minas Gerais tem com ações e serviços públicos de Saúde, inclusive a folha de pessoal e manutenção dos hospitais.
Com o montante, o Governo de Minas consegue pagar toda a folha dos órgãos da segurança pública, com sobra de R$ 1,5 bilhão.
O Regime de Recuperação Fiscal – RRF
De acordo com o Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais elaborado e divulgado pelo Tesouro Nacional em agosto do ano passado – desde fevereiro de 2018, Minas Gerais conta com liminares que suspendem a execução de contragarantias, por parte da União, no caso de não pagamento de operações de crédito do Estado. O Estado esteve assim, portanto, usufruindo antecipadamente de parte dos benefícios do RRF-Regime de Recuperação Fiscal.
Minas Gerais atende cumulativamente os três requisitos de habilitação previstos no art. 3º da LC 159, de 2017, estando, portanto, elegível ao Novo RRF. Nesse contexto, o Estado poderia assinar o contrato previsto no art. 9°-A da LC 159, de 2017, que suspende por até 12 meses o pagamento de suas dívidas com a União e daquelas com o sistema financeiro garantidas pela União, durante o período de elaboração do PRF.
Destaca o Boletim do Tesouro Nacional que o processo de adesão também sofreu alterações importantes. Destaca-se o fato de que o Estado poderá usufruir ao longo do processo de elaboração do Pedido de Recuperação Fiscal – PRF suspensão do pagamento do serviço da dívida por até 12 meses.
Dessa forma, Estados em desequilíbrio não precisarão esperar a adesão para usufruir deste benefício, o que minimiza a necessidade de buscar a antecipação desse benefício na justiça, o que foi a opção de diversos Estados desde 2017 (AP, GO, MG, RN e RS). Os passivos referentes aos valores inadimplidos em decorrência desses processos judiciais podem ser refinanciados por meio do dispositivo previsto no art. 23 da LC nº 178, de 2021, que prevê um pagamento ao longo de 30 anos.
Em relação ao conteúdo do pedido de adesão ao RRF, mantém-se a necessidade de o Plano equilibrar as contas do Estado. Das leis e atos normativos que devem fazer parte do Plano de Recuperação Fiscal do Estado, conforme inovação feita pela LC nº 178, de 2021, destacam-se a inclusão do estabelecimento de uma limitação das despesas primárias que vigore ao longo da duração do RRF e a substituição da exigência de privatização pela exigência de alienação total ou parcial de ativos do Estado. A segunda alteração é especialmente relevante, visto que o atendimento à exigência de privatização constituía entrave para o andamento do processo de adesão nos Estados.
Outra significativa alteração foi o aumento do período máximo de vigência do Regime, originalmente de três anos extensíveis por mais três anos, para até nove anos. Na nova versão, o benefício da suspensão de pagamento do serviço da dívida não será integral por três anos com decréscimo linear a partir do primeiro exercício de prorrogação, mas diminuirá linearmente até o encerramento do Regime desde o primeiro ano.
Com o Regime em vigor, o Novo RRF prevê mecanismos que dão ao Estado flexibilidade tanto na implementação das medidas do Plano como na observação das vedações à adoção de medidas que possam agravar a situação de desequilíbrio.
As vedações têm o objetivo principal de conter a expansão das despesas obrigatórias e proibir a adoção de medidas que acarretem a redução das receitas. Assim, são vedados, por exemplo, os reajustes remuneratórios, a contratação de novos servidores, a realização de concursos públicos e a concessão de benefícios fiscais. Essas vedações, no entanto, não são absolutas, visto que podem ser ressalvadas caso o Estado as tenha incluído no PRF e a trajetória de equilíbrio permaneça. Inclusões e alterações do Plano poderão ser feitas periodicamente.
Ademais, como forma de melhorar o acompanhamento da execução do Plano de Recuperação, a LC nº 178, de 2021, introduziu obrigações, cujo não cumprimento levam o Estado à condição de inadimplência com as obrigações do Plano. Para os Estados inadimplentes, foram estabelecidas algumas punições, como a proibição de incluir ressalvas às vedações e a aceleração da redução do benefício de suspensão do pagamento da dívida. Nos moldes anteriores, interpretava-se que a não implementação das medidas de ajuste e o descumprimento das metas e compromissos acordados uma única vez levaria à extinção do Regime, o que poderia ser desproporcional a depender da infração. Por sua vez, o Novo RRF só é extinto caso o Estado descumpra suas obrigações por duas avaliações consecutivas.
Até o momento, os Estados do Amapá, Goiás e Rio de Janeiro realizaram pedido para aderir ao Novo RRF.
No entanto, embora elegível ao Novo RRF, o Estado de Minas Gerais requereu junto ao STF a manutenção da suspensão de pagamento do serviço da dívida, sob alegação de que remanescem pendências na regulamentação federal para adesão ao Regime de Recuperação Fiscal. Sobre este ponto, cabe esclarecer que, com a publicação do Decreto nº 10.681, de 2021, que regulamentou as alterações propostas pela LC 178, de 2021, e da Portaria do Ministério da Economia nº 4.578, de 2021, que regulamentou os requisitos de adesão, inexistem omissões normativas para a adesão do Estado ao NRRF.
Além, disso, com a publicação da Portaria STN Nº 931, de 2021, o processo de elaboração do PRF também se encontra normatizado. Assim, a STN entende que o Estado de Minas Gerais poderia obter a suspensão do pagamento da dívida por via administrativa, não havendo razão para a continuidade do litígio judicial.