Pedro da Lica tocava sua vidinha lá em Dores na maior tranquilidade. Muito estimado, tinha entrada em qualquer roda, todo mundo apreciava suas papeatas. Se perguntavam o que andava fazendo, bem que podia responder como um outro sujeito, meio colega dele: – “Tretas.”
Entre seus diversos amigos, um era muito importante: o Doutor Francisco Campos, chamado Chico Ciência, que ele tratava, com toda intimidade, de Chiquinho. Sempre que ia à fazenda em Pompéu, mandava chamar Pedro pra fica proseando, contando caso, empurrando o tempo.
Achava aquilo a maior diversão, apreciava demais o jeito inventivo e alegre do conterrâneo, seu amigo desde menino. Mas era cismado com a despreocupação do Pedro, vivendo assim ao deus-dará, sem nada de mais definido Aconselhava: – “Você precisa pensar nalguma coisa, um emprego, depois tem uma aposentadoria, uma tranquilidade pra você e a família no fimda vida”. Ele ouvia, atencioso e agradecido, mas quebrava pau no ouvido. Preferia continuar livre de compromisso, horários e sujeições.
Nomeado Secretário da Educação, Chico Campos mandou chamar Pedro da Lica na fazenda: – “Agora faço questão de te arrumar um emprego. Naturalmente, não é coisa do outro mundo, mas com o tempo vai melhorando. Como é, posso providenciar?
Meio sem jeito, Pedro agradeceu: “Não, Chiquinho. Ocê me desculpe, mas não dou pra isso não, não tenho sofrimento pra essas coisas. Melhor deixar quieto, preocupa comigo não”.
O Secretário tentou o que podia: aconselhou, usou de todos os argumentos, nada convencia o amigo. Voltou contrariado, mas não desistiu. Mandou recado, convidou Pedro pra passar uns dias na Capital, podia fazer uma experiência, quem sabe não gostava? Ele ladeava, cada hora com uma desculpa: um compromisso importante e urgente, havia combinado algum negócio, quando desse uma folga, aparecia.
Aí Chico Campos foi nomeado Ministro do Getúlio. Logo que pôde, deu uma chegada na fazenda. Antes mandou prevenir: tal dia o motorista ia pegar o Pedro em Dores.
Depois de perguntar por todos, saber e contar novidades, insistiu no assunto de sempre. Pedro tinha de aceitar um emprego, era uma questão de responsabilidade, e também um cavalo arreado que podia não passar de novo. Agora, ele Ministro, melhorava muito a situação. Além do mais, as coisas mudam, ninguém sabe o dia de amanhã. E concluiu com o principal motivo: – “Também, eu quero ter o prazer de te ajudar, essa satisfação ninguém me tira”. Mas o amigo, por nada desse mundo, se animava a pedir alguma coisa.
O Ministro voltou pro Rio aborrecido. Mas não arredava pé. Aproveitava portador, mandava recado por meio de carta, queria saber se o amigo tinha alguma decisão. No encontro seguinte, tornou a tocar no assunto: – “Escolhe sem cerimônia, fala o que você quer que eu arrumo. Faço questão de te arranjar uma colocação enquanto posso”. Bateu tanto naquela tecla, falou tanto que o outro foi ficand sem graça. Pensou, pensou, tomou coragem e disse:
–Tem uma coisa, não sei se vai dar jeito…
– É só falar, Pedro, que eu providencio. Em que que você pensou?
– perguntou o Ministro todo feliz.
– Cê garante que não vai ofender comigo, Chiquinho?
– Ofendo não, seja lá o que for.
– Corre um boato que vai vagar o bispado de Luz. Taí uma coisa que me interessa.
Chico Campos continuou mandando buscar o Pedro da Lica pra contar caso na fazenda. Mas nunca mais falaram de emprego.
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