O Tiro no Pé de Bolsonaro
O Tiro no Pé de Bolsonaro
O Tiro no Pé de Bolsonaro

Luis Paulo Rosenberg*

A manifestação bolsonarista de 7 de setembro pode ser considerada um sucesso de mobilização, com multidões nas principais cidades do País. Daí a se atribuir ao evento uma vitória do Executivo contra o STF e o Congresso, com avanço do movimento golpista continuísta, vai uma distância estelar.

De fato, o número de manifestantes é insignificante para respaldar tal conclusão, como um simples exercício ilustra bem. De uma população de potenciais apoiadores de cerca de 180 milhões de brasileiros, Bolsonaro conta com 20% de bolsominions fiéis, um número insuficiente até para garantir a presença dele no segundo turno de 2022. De fato, se destes 40 milhões de brasileiros, 1% decidiu ir às manifestações da Independência, teríamos 400 mil pessoas, mais ou menos a soma dos que efetivamente compareceram. Convenhamos, nossas instituições democráticas não são sequer triscadas pela expressão da vontade de menos de meio por cento da população que poderia se manifestar.

Da mesma forma que uma manifestação com o dobro de participantes antibolsonaristas no domingo próximo, também não enterra a candidatura do Presidente. É necessário aguardar o desdobramento do poder de mobilização dos dois lados, antes de se inferir para onde marcha a sorte do atual Presidente; se tiver tido o condão de detonar recorrentes manifestações, seja de um lado ou do outro, o evento desta semana seria o estopim de uma mobilização popular pró ou contra Bolsonaro.

Há, contudo, um experimento internacional que pode servir de indício para o que Bolsonaro pode esperar: a tentativa de Trump de impedir a formalização de sua derrota no Congresso, logo após ser batido na contagem dos votos. Lá, a tentativa de mobilizar apoiadores para ganhar no tapetão o que foi perdido nas urnas redundou em desgaste mortal do cacife político de Trump, hoje um ônus carregado pelos Republicanos. O ataque às instituições democráticas provou-se um tiro no pé, lamentado pelas lideranças do Partido Republicano, que produziu uma influência cadente de Trump na política americana.

Parece que nosso Trump tupiniquim resolveu aplicar para seu futuro o lema de que “não se mexe em time que está perdendo” e replica no Brasil o fracassado modelo de Trump. Como estamos a um ano da campanha presidencial, é bem possível que Bolsonaro sequer seja um candidato viável até lá. Como a política abomina o vácuo, dois exemplos importantes do minguar presidencial: próceres fisiológicos do Centrão começam a abandonar a nau de Bolsonaro e o nome de um militar admirável, como o General Santos, começa a ser cogitado pela Direita mais consciente.

Outro sintoma de que Bolsonaro é o rei do tiro no próprio pé é a matéria do Estadão do dia da Independência, revelando inconfidências de membros da equipe de Paulo Guedes. Como vínhamos alertando há meses, assessores afirmam que o despautério presidencial, provocando intranquilidade institucional, é o maior inimigo da economia. De nada adianta a coerência da política econômica, se seu pano de fundo for sólido como geleia. Um dos assessores ressalta com propriedade: não fosse a insegurança induzida pelos pronunciamentos de Bolsonaro, a lógica macroeconômica já teria conduzido a taxa cambial para abaixo de R$ 5,0/dólar, com ganhos significativos no combate à inflação e na preservação do poder aquisitivo do salário.

Moral da história: o incrível presidente que encolheu, elegeu a estratégia de se tornar mais querido aos que já o amam de paixão do que alargar sua base de sustentação. Como nos ensina a Aritmética, isto representa uma opção por não contar com as urnas para se manter no poder. Como o comando das forças armadas se mantem alheio ao embate político, a polícia militar também e a manifestação de ontem foi surpreendentemente pacífica e civilizada, a tendência é mais para Bolsonaro se esvair sozinho do que ser impedido. E sem golpe, o Mito ficará com 20% dos eleitores como limite superior de sua eventual votação.

*Economista e consultor, com carreira destacada nas áreas acadêmica, empresarial e na atividade pública. PHD em economia pela Vanderbilt University, atuou como assessor do Ministro Delfim Neto, responsável pelos setores de Ciência, Tecnologia e Investimentos em Energia. Foi membro da equipe de negociação com o FMI, membro do Conselho de Administração da Cia. Suzano, Nestlé e Banco BBVA. Atualmente é sócio-diretor da Rosenberg Partners. (Fonte: Investing.com – 09.09.2021)

Anúncio