Em 2017, o spread bancário ficou acima da média histórica, mantendo elevado o comprometimento de renda das famílias com pagamento de juros
Não há dúvida: é o maior do mundo o spread bancário brasileiro, que é a diferença entre o que os bancos pagam pelo dinheiro captado em depósitos e aplicações e o quanto cobram de juros nos empréstimos. A demonstração está em pesquisa feita pela Fiesp, que comparou os dados de países que empregam metodologia semelhante à brasileira para o cálculo do spread. Na média, os países analisados têm spread de 1,5 ponto percentual, contra 21,5 pontos percentuais da média brasileira.
A análise mostra também que a situação tem piorado. A diferença entre o spread atual e o que era praticado no Brasil no período de 2012 a 2014 fará com que entre 2017 e 2022 as pessoas físicas gastem R$ 1,04 trilhão a mais para pagar os empréstimos contraídos em 2017.
“Certamente há uma distorção nesse cenário, pois só no ano passado, os bancos brasileiros tiveram lucro maior que a soma das 262 empresas de capital aberto. Sou o presidente da maior entidade empresarial do Brasil, e sou a favor do lucro justo, porém quando se tem uma situação de falta de concorrência, fica evidente o abuso”, enfatiza o presidente da Fiesp e do Ciesp, Paulo Skaf.
Não há justificativa para a diferença entre o spread brasileiro e o de outros países. Um dos principais componentes para o cálculo do spread, que é a inadimplência, é menor no Brasil que em outros países. O Brasil ocupa apenas a 66ª posição no ranking da inadimplência, atrás de países que possuem spread bem menos elevado, como Itália, Irlanda, Portugal, Rússia e Espanha. “A Itália tem inadimplência 4,4 vezes maior do que a do Brasil, mas o spread total brasileiro é quase 20 vezes maior”, explica José Ricardo Roriz Coelho, segundo
vice-presidente da Fiesp.
Os bancos também usam como justificativa a falta de garantias e a dificuldade de recuperação do crédito no país, mas, mesmo nas linhas com boas garantias, como o empréstimo consignado para aposentados e servidores públicos e o financiamento de veículos, os spreads são elevados demais em comparação com o praticado em outros países.
“Os juros do Brasil sempre foram os mais altos do mundo, e as pessoas se acostumaram com isso. A Campanha do Sapo contra os juros abusivos, lançada em março, é justamente para conscientizar a população e juntos mudarmos esta situação absurda”, explica Paulo Skaf.
DESCASAMENTO
Fatores que deveriam ter provocado redução do spread não tiveram efeito. Exemplo é a queda da Selic, a taxa básica de juros, determinada pelo Banco Central. A pesquisa da Fiesp e do Ciesp mostra que de outubro de 2016 a fevereiro de 2018 a Selic foi reduzida em 52,6%, caindo de 14,25% ao ano para 6,75% ao ano; no mesmo período o spread apresentou redução bem menor, de 21%, passando
de 62,3% ao ano para 49,2%. A inadimplência também diminuiu no período, de 6,2% para 5,2% nos recursos livres emprestados pra pessoas físicas.
“Entre dezembro de 2017 e fevereiro de 2018, a Selic passou de 7,0% a.a. para 6,75% a.a., mas, os juros do crédito pessoal total aumentaram, de 44% a.a. para 47% a.a., a despeito da inadimplência ter ficado praticamente constante, de 3,64% para 3,65% da carteira”, afirma Roriz.
O estudo destaca também o elevado nível dos juros para as pessoas físicas, sobretudo os do cheque especial e do cartão de crédito rotativo que ultrapassam os 300% ao ano e, juntos respondem por 48% das concessões para pessoas físicas.
A pesquisa mostra ainda que, em 2017, o spread médio para pessoas físicas foi de 54,6 pontos percentuais ao ano, significativamente maior do que a média do período 2012/14, de 34,5 pontos percentuais ao ano, apesar de a inadimplência se encontrar em um patamar médio 10% mais baixo que no período 2012/14.
Para o spread médio de 2017 ser compatível com os números de 2012/14, já considerada a inadimplência em ambos os períodos, deveria
ser de 31,1 pontos percentuais, em vez de 54,6 pontos percentuais. Essa redução de 23,5 pontos percentuais equivaleria a uma economia para as famílias de R$ 141,6 bilhões a menos com juros em 2017, ou seja, 2,2% do PIB. Esses recursos reduziriam o comprometimento de renda com pagamento de juros de 10,1% para 6,7% da renda das famílias, e poderiam ser convertidos em consumo e poupança, impulsionando a recuperação econômica do país.
Ainda, levando em consideração o prazo médio das concessões em 2017 (53 meses), podese calcular que essa diferença de 23,5 pontos
percentuais fará com que as famílias gastem ainda R$ 899 bilhões a mais de juros entre 2018 e 2022, que somados ao valor pago em 2017 (R$ 141,6 bilhões) totalizarão R$ 1,04 trilhão a mais de juros a serem pagos de 2017 a 2022.
“Em linhas com os juros mais altos, como o cheque especial e o cartão de crédito, normalmente, os mais atingidos são as famílias de menor renda. E não podemos deixar que isso continue acontecendo”, finaliza Paulo Skaf.
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