A balança comercial brasileira começou a sentir os efeitos do desaquecimento do comércio internacional. Nos primeiros meses do ano, o aumento do preço do minério, em decorrência do acidente de Brumadinho, e a demanda excessiva por soja, motivada pelos embargos comerciais chineses aos EUA, mantiveram as exportações alinhadas com o resultado dos três anos anteriores, mas a força destes itens foi sufocada pelo crescimento modesto das economias parceiras.
Dos três produtos mais exportados pelo Brasil, dois estão intimamente relacionados com o vigor da economia chinesa. O petróleo e o minério de ferro são insumos para a indústria oriental, que é penalizada pelos embargos americanos. O resultado líquido desta briga entre gigantes é a redução da demanda sobre 20% de tudo o que vendemos ao mercado externo. A isto, se soma a procura menor por soja, decorrente da peste suína asiática.
A Argentina, outro grande parceiro comercial brasileiro, atravessa uma crise econômica severa. De acordo com o FMI, a economia deve encolher mais de 1% no ano. Neste caso, os produtos manufaturados são os mais afetados, especialmente a indústria automotiva, que vê suas vendas caírem cerca de 30% neste ano.
Ao longo dos próximos meses, devemos assistir à continuidade do descolamento do saldo comercial de 2019 em relação à média dos últimos três anos. Não há sinais de que os movimentos de queda da demanda por produtos brasileiros cessem no curto prazo.
Empresas e setores: Setor de construção
Na semana passada, o IBGE divulgou os dados do PIB, com crescimento de 0,4%. O setor de construção civil (infraestrutura e construção de imóveis) cresceu 2% em comparação ao ano anterior. A melhora está relacionada com crescimento de 10,7% do crédito para financiamento habitacional.
Durante a mesma semana o governo divulgou que estuda a redução dos juros do programa Minha Casa Minha Vida para famílias com renda de até R$ 7 mil. A avaliação levou em consideração a nova modalidade de financiamento atrelado a inflação medida pelo IPCA.
É verdade que o setor de construção de imóveis está contribuindo para recuperação da economia, com crescimento nas vendas, maior volume de lançamentos, redução de estoques e de distratos.
Entretanto, o segmento irá se deparar com um período mais restritivo de financiamentos com recursos do governo. O Minha Casa Minha Vida, que completou 10 anos em março de 2019 e beneficiou mais de 400 mil famílias, com investimentos acima dos R$ 110 bilhões do orçamento geral da União, hoje sofre com atraso nos repasses para as construtoras. O valor atual se aproxima dos R$ 500 milhões somente na faixa 1 do programa, que atende famílias com renda de até R$ 1,8 mil. Conforme divulgado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), os atrasos nos repasses ultrapassam 60 dias, impactando até o momento 900 obras. A inadimplência ameaça o emprego de cerca de 200 mil trabalhadores.
Além disso, o governo anunciou que pode suspender as contratações o Minha Casa Minha Vida para 2020, com o objetivo de reduzir as despesas obrigatórias e aliviar o orçamento para o próximo ano. A decisão impacta diretamente as construtoras, que deverão disponibilizar novas modalidades para financiamento habitacional, adequando-se à nova realidade do setor. Os últimos dados divulgados pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) mostram a relevância do programa para setor, com crescimento de 20% nos lançamentos e alta de 2,3% nas vendas nos últimos 12 meses.
Gestão: Ainda há quem acredite em contágio?
O grande destaque da semana que passou foi a Argentina. De forma inesperada pelo mercado, o governo do presidente Mauricio Macri anunciou na quarta-feira à noite o “reperfilamento” da sua dívida com o FMI. O país não considera tal medida como um default, argumenta que o montante principal devido será pago, a despeito do descumprimento dos prazos contratuais. Em dissonância, as agências de rating não concordaram com a posição da Casa Rosada e rebaixaram a nota para “Default Seletivo”, e posteriormente reclassificado para CCC, nível proibitivo para diversos grandes fundos de investimento internacionais.
A grande questão seria sobre um eventual contágio portenho aos ativos brasileiros. Saberiam os investidores internacionais que a capital do Brasil não é Buenos Aires? Os mesmos investidores teriam conhecimento do tamanho das reservas internacionais do Brasil? Ou ao menor sinal de “venda”, o Brasil seria atingido?
Para a MAPFRE Investimentos, após seguidas renegociações argentinas com investidores e bancos internacionais, o contágio seria marginal. Este aconteceria principalmente por duas vias: (i) ligeira queda da atividade econômica em virtude da diminuição do comércio bilateral, (ii) marginal rebalanceamento de portfólio entre emergentes. Portanto, os efeitos supramencionados serão sentidos a médio prazo, talvez até diluídos em uma melhora ou piora da atividade econômica brasileira.
Aparentemente, o mercado local teve a mesma visão. No dia seguinte ao anúncio do reperfilamento unilateral, a Bovespa subiu +2,37%, fechando a semana novamente acima dos 100 mil pontos.
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