* Por Carlos Alberto Teixeira de Oliveira
O Brasil que desaprendeu o que é crescer
Os brasileiros precisam recuperar a bandeira de nossas bandeiras, que é a Esperança!
O Brasil precisa se reconciliar com o crescimento econômico vigoroso, consistente, contínuo, sustentável e eleger o desenvolvimento como a nossa meta prioritária número 1!
O crescimento econômico vigoroso deve deixar de ser apenas uma casualidade, uma questão episódica, uma efemeridade, um acontecimento meramente fortuito para se transformar, efetivamente, na grande meta econômica nacional, permeando a convolação do País em uma economia madura e desenvolvida. Nesta direção, já tivemos antes, vários exemplos de sucesso e que poderiam nos servir de inspiração, como foi o caso do Plano de Metas, implementado durante o Governo JK.
País que não cresce é país condenado à pobreza e ao subdesenvolvimento, e, por isso, torna-se imprescindível o estabelecimento de uma “Agenda Estratégica para o Desenvolvimento Nacional” – em que a transformação do Brasil em Nação Desenvolvida seja o grande objetivo.
JK já afirmava que as maiores ameaças à democracia são a miséria, o desemprego e o subdesenvolvimento. Ao longo destas últimas três décadas, a busca obsessiva pela estabilidade econômica tem nos ofuscado todas as possibilidades de colocar o desenvolvimento como a nossa grande, prioritária e fundamental meta nacional, e corremos ainda o risco de ficarmos durante os próximos vinte anos relegando o crescimento vigoroso pela discussão centrada apenas no ajuste e no equilíbrio das contas públicas.
JK também já alertava que é preciso que nos capacitemos, de uma vez para sempre, de que o desenvolvimento do Brasil é uma condição ligada à nossa sobrevivência num mundo que se impõe, mais e mais, pela força de sua vertiginosa marcha técnica. Não temos de nos desenvolver apenas por ambição mesmo justa, mas desenvolver para sobreviver.
Sem investimento não há hipótese de desenvolvimento!
Já tivemos antes a oportunidade, juntamente com vários outros economistas, de ressaltar a necessidade de compreendermos a importância da retomada do crescimento econômico; alguns equívocos têm permeado as políticas econômicas do País e, se persistirem, obstruirão inapelavelmente qualquer tentativa de relançamento da economia brasileira de volta ao caminho do desenvolvimento. Não basta apenas crescer. É necessário que o crescimento da nossa economia supere a média mundial e possa se compatibilizar com o nível de expansão das economias dos países emergentes. E, ainda, que incorpore outros elementos, como as da qualidade, da produtividade e da competitividade.
Um desses equívocos diz respeito à crença de que a estabilidade econômica é condição prévia à retomada do desenvolvimento do País. Primeiro a estabilidade, só depois o desenvolvimento. Sendo assim, as políticas de estabilização assumem um caráter de primazia absoluta, subordinando e sufocando todas as outras políticas. Apequena-se a política econômica, amesquinham-se os objetivos para a economia do País. E já lá se vão algumas décadas de busca inglória da miragem da estabilidade.
Evidentemente, ninguém, em sã consciência, há de negar a necessidade de as economias nacionais ostentarem bons e saudáveis fundamentos macroeconômicos. O caminho da estabilidade deve ser concebido e implementado, no bojo de uma política de desenvolvimento para o País. A estabilidade não precede o desenvolvimento; ao contrário, é a estratégia de desenvolvimento do País que deve, simultaneamente, orientar e contextualizar as opções da política macroeconômica. Até porque, ao contrário do que se costuma propagar, os caminhos possíveis para se alcançar a estabilidade econômica são vários.
Outro desses equívocos é imaginar que apenas o ajuste fiscal e algumas reformas – como a previdenciária – também devem ser considerados como condições prévias à retomada do desenvolvimento. Da mesma forma colocada em relação à estabilidade econômica, deve-se privilegiar – concomitantemente – a expansão econômica que produzirá ganhos generalizados e, em especial, aumentos da arrecadação tributária. Cabe destacar que, quando um denominador é baixo, todos os numeradores podem ser considerados altos – o que se aplica efetivamente no tocante à questão das receitas e despesas públicas. Quando há declínio da atividade econômica, como ocorre nos anos mais recentes – a produção nacional não cresce – os lucros se transformam em prejuízos para empresas e, com isso, não há como gerar Imposto de Renda e outras receitas.
Aspecto fundamental para superar a questão do fraco crescimento econômico, em primeiro lugar, passa pelo resgate da confiança, da credibilidade e do otimismo, para considerarmos que esta situação crítica pela qual hoje atravessa o país não seja considerada contínua, definitiva ou duradoura. Sempre o Brasil deu provas concretas de sua capacidade para superar os seus principais problemas e entraves, de forma eficiente e rápida, mas isso depende, principalmente, da inadiável exigência de realização de profundas reformas políticas, sociais e econômicas, bem como torna-se hoje imperativo desideologizar e despolitizar o debate econômico, sintonizando-nos com as várias transformações em curso na economia internacional para lhes captar as tendências mais prováveis de realização e aqui antecipá-las na sua implementação.
O Brasil está acometido de uma doença que intitulo de “síndrome do raquitismo econômico” – em função do intenso declínio dos seus níveis de produtividade e pela constante retração da atividade econômica, principalmente quando comparados com as médias mundiais. A constatação, como já mencionado anteriormente, é que desaprendemos a crescer, e a nossa máquina propulsora do crescimento econômico vigoroso e contínuo enferrujou-se ou está quebrada. País que não cresce está condenado ao ananismo, ao atraso e ao empobrecimento. Isso potencializa tensões e perspectivas sociais explosivas – podendo colocar em risco a ainda incipiente democracia brasileira.
É indispensável, ademais, recuperar a nossa capacidade de planejamento estratégico de longo prazo, que entendo, deva ter, como fundamento básico, a nossa transformação em Nação Desenvolvida. É preciso nos sintonizar com as rápidas e importantes transformações por que passa a economia internacional, a sua estrutura produtiva e as novas dimensões trazidas por novos e potenciais mercados, como seriam os casos da China e Índia, além de outros.
Para isso ocorrer, é preciso formar uma “intelligentsia” nacional com o objetivo de se definir que, para a nossa transformação rumo ao desenvolvimento, será exigida, como a primeira de todas as metas, a do crescimento econômico vigoroso, consistente, contínuo e sustentável. Nesse sentido, ganha relevância e requer ênfase especial as prioritárias questões da produtividade, da inovação tecnológica, da qualidade e competitividade, da reforma tributária, da eficácia e melhoria da educação em todos os seus níveis.
O Brasil foi um dos países que mais cresceram no século passado e, durante a sua 2ª metade, o crescimento vigoroso da economia nacional ficou conhecido como “Milagre Brasileiro”. Em todo o século XX, o PIB nacional registrou declínio em apenas 13 ocasiões. A título de ilustração, no período de 1957 a 1976, o PIB nacional contabilizou expansão média anual de 8% e, no acumulado, o aumento atingido foi de 365% – ou seja, a economia brasileira praticamente quadruplicou de tamanho em apenas 20 anos. Portanto, a história já nos demonstrou e comprova que sabemos fazer desenvolvimento e crescimento econômico expressivo.
A seguir, algumas frases daquele considerado o “Profeta do Desenvolvimento Brasileiro”, o ex-presidente da República Juscelino Kubitschek de Oliveira – (período de 1956/1961), com o objetivo de tê-las aqui como contribuição a uma reflexão sobre a atual situação econômica brasileira e os destinos que urgentemente precisamos voltar a trilhar:
-“Numa hora de desalento e desânimo, em que a situação do país nos coloca nas pontas deste dilema: progredir ou perecer – orgulho-me de ter desfraldado em nossa pátria a bandeira do desenvolvimento nacional, na mais perfeita vigência do regime democrático”.
-“Quando lancei, em meu Estado natal, como fulcro de um programa de governo, o binômio – energia e transporte, justifiquei essa decisão lembrando que os fatos estavam a evidenciar esta verdade: nenhum acelerado processo de desenvolvimento econômico se pode verificar em uma região a que faltem energia e transportes, ainda que nela ocorram, em abundância, matérias-primas e outros recursos naturais, a par de uma população ativa e ordeira. A formação de riquezas e sua concentração em atividades industriais de alta produtividade só se podem efetuar rapidamente, depois que um povo consegue construir a infraestrutura de seus serviços básicos de energia e transportes”.
-“É preciso não esquecer que o problema fundamental do Brasil e dos demais países insuficientemente desenvolvidos não consiste em apenas elevar o ritmo de crescimento. O que cumpre é estabelecer uma taxa mínima de crescimento, a ser observada em determinado período. Assim poderemos atingir um nível de renda per capita que permita o início de um processo cumulativo e autônomo de crescimento, com recursos do próprio país, e diminuir a distância que o separa das grandes potências econômicas, em termos de renda per capita”. –
(Discurso proferido como paraninfo dos alunos dos Cursos de Análise Econômica do Conselho Nacional de Economia – Rio de Janeiro, 9 de dezembro de 1958).
-“Impõe-se, portanto, a conclusão de que, num país como o nosso, não somente as peculiaridades geográficas e humanas, mas também os dados acerca da evolução econômica indicam o desenvolvimento acelerado como o único caminho de salvação. Nenhuma política será legítima, se não objetivar, com caráter prioritário, o desenvolvimento. É essa uma diretriz que já nenhum governo poderá abandonar no Brasil”.
(Conferência proferida no Clube Militar, sobre a política de desenvolvimento seu governo – Rio de Janeiro, 21 de julho de 1959).
-“Os que não se atualizam perdem a corrida da vida, que é a batalha contra o atraso, o retardamento, a conformidade, o subdesenvolvimento, a fome e a submissão, ou a dissolução; a batalha da mocidade dos povos contra as capitulações da desagregação e da miséria! Não digo novidade, acrescentando que também é a batalha da liberdade, como corolário da subsistência. Não julgamos assegurada a liberdade no continente, faltando-lhe a prosperidade. Não a consideramos garantida no Brasil, sem o desenvolvimento. Isso há três séculos reconhecia o pregador genial. É a palavra do Padre Antônio Vieira: ‘Não há mais cruel tirano que a pobreza e a necessidade’.”
(Discurso proferido durante a solenidade de reabertura dos cursos da Universidade do Brasil – Rio de Janeiro, 6 de março de 1960).
De acordo com o IPEAData – órgão ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, durante os cinco anos de governo do presidente Juscelino Kubitschek – 1956/1961, o PIB – Produto Interno Bruto – brasileiro cresceu, no acumulado, 47,5%. A taxa média anual de expansão foi de 8,1%.
Durante o governo JK – 1956 a 1960 – em cinco anos o PIB per capita brasileiro contabilizou uma formidável expansão de 27,2%!
No acumulado do período JK na Presidência da República, a Agricultura brasileira registrou resultado positivo de 20,3%; a Indústria, 61,0% e o Setor de Serviços, 37,5%. Trata-se, para qualquer época em que se queira analisar, de um robusto desempenho, comparável, nos dias atuais, ao crescimento registrado na China e em alguns outros poucos países.
Juscelino Kubitschek de Oliveira deve estar, literalmente, se mexendo no mausoléu do Memorial JK, em Brasília – onde se encontram sepultados os seus restos mortais, enorme a sua decepção com os resultados medíocres apresentados pela economia brasileira: no dia 1º de março de 2018, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – divulgou oficialmente os resultados relativos às contas nacionais de 2018, quando se registrou modesta expansão do PIB – Produto Interno Bruno – brasileiro de 1,1% naquele ano. Revela, ainda, que a renda per capita dos brasileiros – de 2014 a 2018 registra retração acumulada de 8,1% no período. Para nós brasileiros isso se constitui em um verdadeiro desastre e só encontra paradigma em países vítimas de calamidades climáticas, cataclismas, catástrofes ou em situações de guerra.
O Brasil vem acumulando já há anos vários equívocos nas políticas monetárias, cambial e fiscal, o que vem provocando um dos maiores rombos das contas públicas da nossa história econômica, em função da desmesurada elevação das taxas de juros que, ao longo de quase ¼ de século, as posiciona como as mais elevadas e campeãs absolutas, em termos internacionais. Durante os últimos 24 anos, o Brasil já despendeu, apenas a título de pagamento de juros nominais sobre a sua dívida pública, a exorbitante cifra de US$ 1,95 trilhão – o que correspondente ao equivalente a mais de todo um PIB nacional atual. Nesse mesmo período a “des-carga” tributária brasileira elevou-se significativamente, tendo atingido cerca de 1/3 do PIB e o câmbio, quase sempre, manteve-se sobrevalorizado.
O renomado economista André Lara Resende, em artigo intitulado “Juros e conservadorismo intelectual”, publicado na edição 843 de Eu & Fim de Semana do Valor Econômico, de 13 de janeiro de 2017, questionou a “teoria monetária que até hoje balizou as políticas dos bancos centrais” e que pode estar equivocada. Ele afirma: “Sem equilíbrio fiscal, não há saída. Quando o país passa por um delicado momento político e pela sua mais séria recessão em décadas, vale a pena acompanhar, sem ideias preconcebidas, a discussão na fronteira da teoria macroeconômica. O custo do conservadorismo intelectual nas questões monetárias, durante as quatro décadas de inflação crônica do século passado, já foi alto demais”.
Em épocas passadas, chegou-se a afirmar que “ou o Brasil combatia as saúvas ou elas acabariam com o Brasil”. Traduzindo para os tempos atuais é como afirmar que “ou o Brasil reduz as suas taxas de juros ou os juros liquidarão com o país”. Reduzir as taxas de juros aqui praticadas em níveis que possam ser considerados civilizados é uma imposição de ordem, de segurança nacional. Não se pode esperar mais, até mesmo porque taxa de juros não é o único componente para o exercício de uma política monetária eficaz e saudável. O Brasil, ao longo de todo esse tempo, lembra muito o período do presidente Antonio Salazar (1932-1968) à frente da nação portuguesa, quando, não obstante desfrutar de uma excepcional estabilidade e equilíbrio econômico, Portugal simplesmente não conseguia crescer, transformando-se numa das economias mais raquíticas, pobres e frágeis de todo o continente europeu.
O Brasil acaba de atravessar a mais longa, intensa e grave crise econômica de sua história completando, em 2016, três anos seguidos de efetiva recessão –. Com o crescimento de apenas 1,1% em 2017 e 2018, o País ficou muito aquém da média de crescimento mundial, de 3,7%. Para 2019, as projeções indicam que estaremos completando o 9º ano seguido em que o crescimento econômico do país será inferior à média mundial. E, pelo andar da carruagem, o quadro tende a se deteriorar e a, cada ano, nos distanciar mais e mais do mundo desenvolvido. Para o FMI, em suas projeções para a economia mundial que vão até o ano 2023 demonstram que, até lá, o Brasil continuará registrando desempenho econômico muito inferior à média mundial.
A recente crise econômica brasileira distingue-se de todas as demais anteriores porque não esteve ligada a questões climáticas, cambiais ou a outros problemas de natureza exógenos, podendo ser considerada ou rotulada bem mais séria por causa das condicionantes morais e políticas nela envolvidas, com uma evidência de corrupção sem paralelo na história. Em termos econômicos, o que o país vivenciou é bem comparável e somente típico de países em situação de guerra, como já mencionado antes.
* Por Carlos Alberto Teixeira de Oliveira
Economista. Presidente da ASSEMG – Associação dos Economistas de Minas Gerais e Editor-Geral de MercadoComum