Trata-se de uma conta simples de aritmética. Com a inflação oficial (IPCA) em 10,25% no acumulado dos últimos meses anteriores a setembro passado e a taxa Selic (juros básicos da economia), que baliza a rentabilidade dos ativos de renda fixa, na faixa de 6,25% ao ano, desde a reunião do Copom de 22 de setembro passado, não há muito o que fazer. A não ser procurar reduzir as perdas na renda fixa e na bolsa de valores (B3) em queda de 12% em dólar no acumulado do ano até 10 de outubro. E acompanhar as oscilações de ativos como dólar e ouro e imóveis para ver se é possível superar em determinado prazo o IPCA que reflete uma cesta de produtos. Itens como alimentos, gasolina e gás superam em larga escala a inflação oficial.
Todos os ativos de renda fixa perderam para a inflação em setembro passado e devem continuar nessa situação enquanto ocorrer a disparidade entre os percentuais da Selic e do IPCA anualizados. As cadernetas de poupança rendem líquidos 70% da taxa dos CDIs que acompanham o percentual da Selic. Sobre a rentabilidade dos demais ativos de renda fixa ainda pesam as alíquotas elevadas do Imposto de Renda. Nos fundos de investimentos financeiros, o sistema semestral de “come cotas” ainda reduz mais a rentabilidade.
O boletim Focus do Banco Central (BC) de 18 de outubro passado prevê uma ligeira melhora nesse quadro no final de 2021 e no próximo ano. O IPCA pode acumular ao final de dezembro próximo alta anual de 8,69% e a Selic 8,25% ao ano no mesmo período. Para 2022, o Focus, que reflete a opinião dos principais analistas do mercado financeiro, prevê novas melhoras. O IPCA deve alcançar 4,18% ao final de 2022 diante de Selic na faixa de 8,75% ao ano, no mesmo período.
As previsões quanto aos cenários econômicos interno e externo não são boas. Internamente, a previsão é de PIB crescendo 5% este ano, e apresentando a variação positiva modesta de 1,5% no próximo ano. Alguns bancos estimam crescimento ainda menor em 2022.
Então em dois anos, 2021 e 2022, o Brasil mal conseguirá repor a perda de crescimento econômico nominal de 2020 quando o PIB despencou devido às consequências da pandemia.
A proximidade do ano eleitoral traz o risco do crescimento maior do déficit público e mudança no comando da política econômica. Já circulam rumores sobre a possível saída do ministro Paulo Guedes, da Economia, caso o governo consiga furar o teto dos gastos públicos. Auxiliares do ministro Guedes ameaçam deixar o governo quando as pressões de crescimento do endividamento crescem.
A imagem do ministro Paulo Guedes ficou arranhada com a denúncia da aplicação dele em dólar em paraíso fiscal. O ministro com formação de banqueiro revelou, no entanto, que sabe gerir bem suas reservas já que o dólar subiu 40% em relação ao real no governo Bolsonaro.
Considerando-se reservas financeiras sob a dualidade da segurança e rentabilidade, não se pode condenar o ministro. Quem tem muito dinheiro aplica sempre boa parte do total em dólar no Brasil ou no exterior. No País, as aplicações mais vultosas em dólar são em fundos cambiais que oscilam de acordo com a variação da moeda norte-americana, em moeda estrangeira em espécie, cartões pré-pagos em dólar e os antigos travellers cheques. Pode-se abrir uma conta no exterior em dólar também. Desde que tudo seja declarado à Receita Federal não há o que contestar.
Pelo boletim Focus, o dólar, que testou agora em outubro o patamar de R$ 5,50 no comercial, deve terminar 2021 em R$ 5,25 e 2022 em R$ 5,25. Acho otimistas essas previsões diante do cenário de instabilidade política que o Bolsonaro provoca e provocará enquanto for Presidente da República. Os modos pessoais dele não devem mudar. Exemplo: mesmo diante do sucesso recente do programa de vacinação, o Bolsonaro recusa-se a se vacinar, desestimula o uso de máscara e a vacinação.
No cenário externo, a inflação encontra-se com tendência de alta nos principais países desenvolvidos, O mesmo acontece com as respectivas taxas básicas de juros.
No Brasil, 70% da receita das exportações referem-se às commodities metálicas e agrícolas. Com a previsão de crescimento econômico menor na China, o superávit da balança comercial do Brasil ora previsto em US$ 70 bilhões pode recuar então. Já que a China é nossa principal parceira comercial.
A entrada de investimentos externos diretos no País previstos em US$ 50 bilhões também tem condições de recuar.
Risco nos títulos e bolsa
Ao aplicar em títulos públicos do tesouro direto com rentabilidade lastreada em IPCA ou Selic existem riscos nos resgates no curto e médio prazo, quando as taxas dessas aplicações oscilam de acordo com a marcação a mercado de seus valores diários. A rentabilidade cheia e atrativa só pode ocorrer ao se resgatar esses títulos nos vencimentos de longo prazo.
O alcance de bons lucros por empresas dos setores bancário, exportação e de consumo obrigatório e as ligadas ao comércio eletrônico, por exemplo, deveriam manter o Ibovespa em patamar mais elevado e estimulando as aplicações em ações. Isto não ocorre na prática. Qualquer ameaça do governo em aumentar o descontrole do déficit público derruba o Ibovespa e acaba afetando o desempenho de ações de companhias com potencial de alta.
Aplicar em bolsa pensando em rentabilidade no médio e longo prazo é tarefa cada dia mais difícil no Brasil. Alcançam sucesso os investidores que operam no mercado de compras e vendas diárias (day trade), quando têm sorte. O Ibovespa vem oscilando na faixa dos 110 mil pontos ao sabor das notícias procedentes governo.
*Jornalista especializado em economia e finanças