Governo federal admite o problema e que há falta de consenso para solucioná-lo, mas afirma que está capacitando servidores para diminuir exigências “criativas de analistas ambientais e técnicos”

O licenciamento ambiental é um dos principais entraves dos empresários que atuam no setor elétrico, especialmente nas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGHs). Um levantamento da Associação Brasileira de PCHs e CGHs (Abrapch) mostrou que o processo costuma levar 9 anos, de acordo com informações obtidas em 81 hidrelétricas licenciadas de 1992 a 2013.
Ao todo, no Brasil 493 empreendimentos aguardam licenciamento ambiental estadual para obtenção de autorização ou outorga junto a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Considerando aquelas em operação, em construção, em estudos e inventariadas, totaliza-se algo em torno de 3 mil plantas.
O tema foi debatido na 3ª edição da Conferência Nacional de PCHs e CGHs, realizado pela Associação Brasileira de Pequenas Centrais Hidrelétricas (Abrapch), no Parque Barigui, em Curitiba.

O que dizem os governos
Após a emissão da licença prévia, obrigação para que o projeto dispute leilões de energia, o processo ambiental leva, em média, cinco anos e nove meses, extrapolando o prazo exigido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), para o início de operação da usina. A situação é reconhecida pelo governo federal.

“É um problema para todo mundo”, afirma a secretária de Apoio ao Licenciamento Ambiental do Programa de Parcerias de Investimento (PPI) ligado à Presidência da República, Rose Mirian Hofmann. “A maior polêmica é quando o licenciamento de termelétricas sai mais rápido do que de energias limpas, um desvio do processo”, diz.

Rose afirma, porém, que o governo federal está trabalhando na “gestão do conhecimento” dos servidores para que muitas das exigências consideradas abusivas sejam eliminadas. “Há muitas coisas que aparecem nos processos de licenciamento e, às vezes, se atribui a criatividade dos analistas ambientais e técnicos que extrapolam o que deveria ser responsabilidade do empreendedor”, diz.

O diretor de avaliação de Impacto Ambiental e Licenciamentos Especiais da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e do Turismo do Paraná, José Volnei Bisognin, conta que no estado existem cerca de 210 PCHs e CGHs, sendo que outros 200 projetos aguardam análise e licenciamento ambiental. “Estamos trabalhando para mudar este quadro. O novo governo já está iniciando a contratação, por concurso de 170 novos profissionais, o que proporcionará maior agilidade no andamento dos processos. Assim, temos uma boa perspectiva no lado do licenciador”, disse Bisognin. Durante o evento ele assinou o licenciamento da PCH Bela Vista, com 29 megawatts.

Potencial e soluções
Ao todo, o Brasil conta com 1.124 PCHs e CGHs em operação – 3ª fonte mais comum na matriz energética brasileira.
Apenas para os projetos que podem ser viabilizados no Brasil – 737 CGHs e 1069 PCHs e que somam 1806 centrais – os investimento previstos são da ordem de R$ 49 bilhões.

De acordo com Rose, ainda falta consenso para definir um caminho para resolver o problema. Ela menciona o Projeto de Lei 3729/04, que dispõe sobre os licenciamentos ambientais e apensou outras 21 iniciativas, e a possibilidade de discussão de duas resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). “O debate está se alterando entre o ambiente do Conama e do Congresso”, resume. Para ela, o fato de as discussões ambientais serem infra ambientais – ou seja, permanecerem no ambiente administrativo – impedem que se produza jurisprudência sobre os licenciamentos.

Na quarta-feira, o Conselho do PPI se reuniu pela primeira vez no governo de Jair Bolsonaro. Em três anos, qualificou 193 projetos, sendo que 147 já haviam sido concluídos, que vão gerar cerca de R$ 260,2 bilhões de investimentos nos próximos anos, sem contar as outorgas de aproximadamente R$ 54,1 bilhões para a União. Agora, o portfólio do PPI conta com 105 projetos, 46 em andamento e 59 incluídos, divididos em 14 setores, incluindo o de energia. Os novos projetos devem atrair R$ 1,6 trilhão de investimentos durante todo o prazo de concessão.

O secretário-adjunto de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia (MME), Hélvio Guerra, afirma que a demora faz com que o setor de energia e o país percam negócios. “Alguém vai esperar 10 ou 13 anos pelo licenciamento? O empreendedor vai investir em outra área. Estamos perdendo capacidade de investimento por essas coisas, como as questões ambientais”, disse. “Há uma percepção errada de que a sociedade não quer hidrelétrica, mas quer eólica e solar, que são intermitentes. Quem faz o suporte da eólica e da fotovoltaica na intermitência, é a termelétrica. Itaipu é a usina de melhor produtividade do mundo”, ressalta.

Na pele
Fabricio Slaviero Fumagalli, do GrupoInteralli, afirma que é preciso ser insistente para investir no segmento elétrico. “Apesar de serem empreendimentos de baixo impacto, com geração de emprego e que possibilitam o aumento do IDH dos municípios, as dificuldades do setor na parte ambiental são muitas. Talvez seja o ponto que mais atrasa os negócios. Como investidor, vamos buscando os estados que realizam o processo com mais agilidade”, afirma Fumagalli, que conta com 7 projetos de PCHs e CGHs, sendo dois deles já em operação no Mato Grosso. Ele acredita que a instalação de uma CGH no Parque Barigui, em Curitiba, pode quebrar um pouco do estigma enfrentado. “É uma boa demonstração de que a usina gera mais benefícios do que impacto”, diz.

Em sua opinião, a pressão exercida pelo Ministério Público é um dos problemas que interfere no negócio. “Não sinto falta de conhecimento e restrição dos órgãos ambientais, mas a engrenagem precisa ser alterada”, opina.

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