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Da falta de que mesmo? Carne?

*Stefan Bogdan Barenboim Salej

Não falta carne na mesa do brasileiro. É mentira que não tem carne na praça. Carne tem à vontade nos açougues, supermercados, nos matadouros municipais e clandestinos pelo país afora. Então porque tanta reclamação?

Simples, não tem dinheiro para comprar a carne de boi, frango, e mais tantos produtos agrícolas, inclusive frutas e verduras. Os preços determinados pela lei de mercado, oferta e procura (alguém já queria eliminar essa lei, mas não conseguiu) subiram além da capacidade da maioria dos brasileiros de comprar. César esta nu, como conta a lenda. Esse choque de preços de produtos agro mostrou toda a fraqueza da nossa economia, que tem um consumidor cada vez mais empobrecido e sem condições de comprar os alimentos que consome e que o mercado oferece.

Os 30 milhões de desempregados e sub empregados, e mais os outros, com salários congelados, são consumidores imaginários e não reais. Porque? Porque os produtos não alimentares, compram à prestação, pagam com cartão de crédito em n vezes, mas a feira e a comida de todo dia, não dá para comprar fiado. Ou quando comprar, tem que pagar em seguida. E para isso, enquanto os preços estavam estabilizados, o povo aguentava. Só não via a subida de preços na feira quem nunca foi lá. Mas agora, com a subida do preço da carne bovina em 40% em pouco espaço de tempo, o balão de ilusão de que estava dando para aguentar estourou. E pelo jeito que os lideres do agronegócio anunciam, especificamente o presidente da Confederação Nacional de Agricultura, o preço da carne não volta para o patamar anterior.

Sem entrar no mérito das grandes teorias econômicas, para cuja defesa e explicação não faltam doutores no país (inclusive educados no exterior), a certeza é que agora vai subir tudo. Atrás do boi vai o frango, arroz, milho, soja, verdura, feijão e tudo mais. E começa também a pressão sobre salários, já que quem tem emprego também não consegue pagar a conta. Em resumo: voltamos à espiral inflacionária? Pelas estatísticas não, mas recentemente o governo teve que corrigir os dados do comércio exterior, erros de digitalização, o que coloca dúvida sobre se não pode haver outros erros. E a outra pergunta que fica é se panelas vazias, desta vez de fato, vão ficar só em casa, ou vão sair para a rua.

Nessa complexidade há alguns elementos que surgem para pensar sobre o assunto. Um deles é se os 232 milhões de cabeças de gado que temos no Brasil, com produtividade media de 1.8 bois por hectare (baixíssima em termos mundiais) atendem o mercado interno e externo. A mesma pergunta vale para todo o setor agrícola: a produção brasileira é suficiente para garantir o abastecimento interno e mais atender à demanda externa? Os chineses garantiram, na crise que estão passando com a peste suína e outros problemas, o abastecimento de sua população. Isso para eles é prioridade e pagam o preço que for. O fato de nós entrarmos nesse jogo é normal, faz parte da economia de mercado, mas não é normal que outras medidas de salvaguarda do abastecimento interno não tenham sido tomadas. Ou que não fosse, na ânsia de vender e mais vender e atender os chineses, visto como vai ficar o trabalhador brasileiro que não tem dinheiro para se alimentar nos preços que estão aí.

Paradoxal é que o Partido Comunista chinês (os chineses, que não queriam aprovar os frigoríficos brasileiros, de repente aprovaram todos) cuida bem dos seus constituintes e nós estamos aqui na  democracia achando que o mercado resolve tudo. Talvez chegamos à situação russa, quando a Tzarina Catarina, ao lhe trazerem o problema da fome do povo, disse que lhes dêem caviar. No STF já resolveram isso com lagostas. Bem, com manchas de óleo, também os peixes sumiram, só para não esquecer que temos mais um problema.

Já faltou boi no pasto no passado, então lições não faltam. E agora falta observar como esse nó górdio criado no agro vai ser desatado. Em dezembro, com festas, férias em janeiro e carnaval em fevereiro, na porta e na mesa.

*Administrador de empresas e cientista político.

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da publicação.

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