Para a LCA – Consultores Econômicos (que acaba de completar 25 anos de fundação), “o ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou ao Congresso Nacional no dia 21 de julho o primeiro texto do governo federal destinado à reforma do sistema tributário. O Projeto de Lei 3887/20 institui a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), imposto que substituirá o PIS/Pasep e a Cofins. Ele será incorporado à tramitação das duas iniciativas que já estão em andamento (PEC 45/2019, da Câmara, e PEC 110/2019, do Senado) na comissão especial da Câmara, composta por deputados e senadores.

A proposta do governo é que a CBS seja um imposto não-cumulativo, ao contrário do PIS/Pasep e da Cofins. A CBS terá uma alíquota única de 12% e terá como base de cálculo a receita bruta das empresas. Instituições financeiras pagarão 5,9% e a forma de apuração não foi alterada. As empresas que fazem parte do Simples não foram afetadas. A CBS não incidirá sobre entidades beneficentes de assistência social (imunes), produtos in natura – não industrializados nem embalados -, templos religiosos, partidos políticos, sindicatos, federações, confederações e condomínios residenciais. Também são isentas receitas obtidas com a prestação de serviços de transporte público coletivo municipal de passageiros (rodoviário, metroviário, ferroviário e aquaviário). A nova contribuição não incide ainda sobre a venda de imóvel residencial novo ou usado para pessoa natural nem sobre valores recebidos do Sistema Único de Saúde (SUS) a título de prestação de serviços de saúde por entidades particulares. Estão igualmente isentas receitas de operações entre as cooperativas e associados.

Guedes destacou que a proposta da CBS é apenas a primeira parte da contribuição do governo para a reforma tributária, e que eventualmente serão enviados novos textos sobre outros tipos de impostos. A ideia é oferecer ao Congresso projetos de lei simples cujo conteúdo possa ser acoplado às PECs já existentes durante as discussões. Além do PIS/Pasep e da Cofins, Guedes antecipou que o governo sugerirá mudanças no Imposto de Renda (IR) e no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), além de uma proposta para a tributação de dividendos. O ministro não mencionou a criação de um imposto sobre movimentações financeiras.

Guedes também defendeu um modelo dual de tributação sobre valor agregado: parte na esfera federal, com a nova CBS, e parte nos estados e municípios, com reformulação do ICMS (estadual) e o ISS (municipal). Ele destacou que os parlamentares devem sugerir mudanças sobre estes dois impostos. Na visão de Guedes compete ao Congresso legislar as relações entre os entes federativos”.

”Proposta da União para tributos coloca limite para estados”

Economistas avaliam que o pontapé dado pelo governo federal na reforma tributária inicia a discussão com a tributação acima do esperado (12%), o que limita estados e municípios na fixação de suas alíquotas caso prevaleça a ideia de unificar todos os tributos que hoje incidem sobre o consumo. Secretários estaduais já esboçaram a preocupação nesta terça (21), principalmente os de estados em dificuldade financeira. Como referência, estimativa feita por técnicos do Ipea no início do ano indicava uma alíquota de 10,3% para a fatia federal e 27% para o global (União, estados e municípios somados). Caso a fatia que cabe a governadores e prefeitos se mantenha como estimado pelo Ipea, a alíquota sobre o consumo total alcançaria 29%, a maior entre todos os países monitorados pela OCDE.

”O governo tropeça na reforma”

 “O governo continua devendo seu projeto de reforma tributária, repetindo promessas e emperrando a tramitação de propostas já em discussão no Congresso. Há consenso, no Brasil, sobre a urgência de uma grande revisão do sistema de impostos e contribuições. A mudança é apontada como essencial para aliviar a produção e permitir o retorno a um crescimento seguro. Aí termina o consenso. O presidente da Câmara e o ministro da Economia divergem sobre a criação de um tributo parecido com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Bandeiras diferentes são defendidas por líderes da indústria, do comércio, dos serviços e da agropecuária. Ao entregar ao Congresso a primeira fase de sua proposta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, começou a cumprir a promessa, feita no ano passado, de encaminhar uma reforma fatiada. Com esse passo o ministro propõe unificar o PIS e a Cofins numa Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o chamado IVA federal, com alíquota de 12%. É uma iniciativa notavelmente modesta. O ministro, afinal, é conhecido por sua retórica em defesa da simplificação do sistema. Quem esperava algo compatível com esse discurso deve ter-se decepcionado. Sendo a simplificação um dos objetivos da reforma, a proposta agora apresentada pelo ministro da Economia nem vale uma discussão preliminar. O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) previsto na PEC 45, da Câmara dos Deputados, e na PEC 110, do Senado, substitui cinco tributos, cobrados pela União, pelos Estados e pelos municípios: PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. Além disso, como lembra o especialista Bernard Appy, citando trabalho do economista Bráulio Borges, o IBS pode elevar o Produto Interno Bruto (PIB) potencial em até 20 pontos porcentuais em 15 anos. Uma reforma limitada ao Pis/Cofins produziria no máximo um décimo desse efeito.

Ao avaliar a diferença entre as duas propostas é preciso considerar também um detalhe político e estrutural muito relevante. O projeto de criação do IBS inclui a absorção do tributo estadual mais importante, o ICMS, e permite eliminar sérias distorções nunca enfrentadas para valer. Várias propostas de reforma tributária foram apresentadas nos últimos 20 anos. Nunca se tratou de forma completa da guerra fiscal entre Estados nem se reduziu de modo significativo o peso do tributo sobre a produção. Por seus vários defeitos, o ICMS tem-se mantido como um entrave à eficiência e à competitividade. Há uma oportunidade, agora, de eliminação desses problemas, até porque as características do IBS têm sido aceitas por secretários de Fazenda de todo o País. Mas a demora do governo federal em apresentar uma proposta completa de reforma está longe de ser o fato mais preocupante. Muito mais grave é a insistência do ministro da Economia em defender um tributo com as características da CPMF, também conhecida em outros tempos como “imposto do cheque”. A figura desse tributo fantasmagórico foi desenhada de várias formas, desde o ano passado, mas nunca se conseguiu ocultar suficientemente sua real identidade. Os defeitos da CPMF são conhecidos e indisfarçáveis. Esse é um tributo regressivo, isto é, socialmente injusto, e cumulativo. Sendo cumulativo, contamina toda a economia direta ou indiretamente, afetando sua eficiência. Mas é, sobretudo, uma aberração, porque incide, de fato, sobre a mera movimentação de dinheiro, sobretaxando operações ou valores já tributados. Não se trata, como às vezes se diz, de forma equivocada, de um imposto sobre transações financeiras. Esse tributo já existe e tem sentido econômico: é o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O ministro da Economia defende essa aberração como forma de compensar a desoneração da folha de pessoal. Essa é uma confusão enganadora. Pode-se discutir a desoneração, mas esse objetivo de nenhum modo justifica a recriação de um monstrinho tributário. Se a compensação é necessária, o governo deve ser capaz de encontrar uma fórmula razoável. Será uma demonstração de seriedade. (Editorial de O Estadão de São Paulo – 21 de julho.)

”Setor de serviços será ‘grande nó’ de reforma, diz ex-Tesouro”

A questão da carga de impostos sobre o setor de serviços será “o grande nó” da reforma tributária. Essa é avaliação do economista Carlos Kawall, diretor do Asa Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional. “O setor de serviços é o que mais está sofrendo com a crise, e representa dois terços do PIB brasileiro. A atividade caiu drasticamente em segmentos como turismo de lazer, turismo de negócios, eventos de negócios, restaurantes, escolas privadas”, disse ele. Em paralelo, Kawall cita que, historicamente, o setor de serviços no Brasil é menos tributado do que a indústria, e que essa é uma distorção que será tratada na reforma. “O setor de serviços sempre foi subtributado, será inevitável mudar isso.” Questionado sobre a proposta apresentada ontem pelo governo, Kawall respondeu que o tema só virou uma prioridade agora com a crise. “A proposta enviada pelo governo é um projeto de lei, o embate é mais simples, pois unifica PIS e Cofins numa espécie de IVA federal. As PECS que já estão na Câmara e no Senado, na minha visão, são mais abrangentes, mas são PECS, precisam de votos. O governo mandou um projeto de lei porque avalia que não tem votos (para aprovar o texto).” Outros especialistas ouvidos pelo Estadão também avaliaram que a proposta do governo ainda é muito tímida e está longe de colocar fim ao cipoal de tributos que engessam os negócios no País. “Dividir em etapas (o envio do projeto ao Congresso) é positivo, pois pode facilitar debates e destravar outras pautas, mas talvez o timing não seja o mais adequado, porque essa discussão poderia ter ocorrido há muito tempo. Houve atraso nesse primeiro encaminhamento”, disse o procurador da Fazenda Nacional Leonardo Alvim, que também é professor do Insper. (Fonte: Estadão)

“Proposta muito tímida”

Roberto Padovani, economista-chefe do BV, considerou a proposta muito “tímida”, acrescentando que os textos já em discussão no Congresso são muito mais amplos. “Não dá para chamar esta proposta de reforma tributária, mas, sim, de fase um”, disse. Ao mesmo tempo em que a divisão das propostas do governo pode facilitar a aprovação das mudanças, há quem veja risco de a reforma perder a força inicial por causa da resistência dos setores mais afetados. “O grande risco é se gastar capital político nessa primeira etapa, que é mais simples e fácil de aprovar. Existe uma estratégia, mas é preciso tomar cuidado para que as propostas não sejam desidratadas ao longo dessa tramitação”, disse Juliana Damasceno, pesquisadora da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (IBRE/FGV). Para Marcos Catão, diretor da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), o maior desafio será a organização do governo para tocar as pautas adiante. “O governo está muito desmoralizado, e deve enfrentar agora a regulamentação desse imposto, o que depende de muitos fatores. É como se fosse um time de futebol: não basta ter bons jogadores, é preciso ter coesão e a torcida.” (Fonte: Estadão)

”Passo tributário”

Por si só, o projeto apresentado nesta terça (21) para a unificação de duas contribuições sociais nem mereceria o nome de reforma tributária. Entretanto o texto levado ao Congresso pelo ministro Paulo Guedes, da Economia, já serve como indicativo das dificuldades envolvidas em um redesenho mais amplo do sistema de impostos. Fundir PIS e Cofins, à primeira vista, pode parecer uma banalidade, dado que se trata de dois tributos federais com a mesma base de incidência —o faturamento das empresas ou, vale dizer, as vendas de bens e serviços— e não raro tratados como uma coisa só. Fosse tão simples, a proposta não estaria em gestação no Executivo desde o primeiro governo da petista Dilma Rousseff (2011-14). Antes mesmo de vir à tona, o projeto já despertava resistências ferozes. A tarefa árdua consiste em fixar uma alíquota —o governo propõe 12%, exceção feita a instituições financeiras (5,8%)—para o novo tributo, batizado de Contribuição sobre Bens e Serviços. Hoje, a depender do ramo de atividade, empresas pagam 3,65% ou 9,25% em PIS e Confins combinados, fora incontáveis exceções e regimes especiais.

Será inevitável, pois, uma alta da carga para parcela expressiva do setor privado, especialmente nos serviços, menos tributados atualmente. Para a indústria, a CBS traz vantagens devido à possibilidade de descontar gastos com insumos ao longo do processo produtivo. Se a simplificação de apenas duas contribuições já provoca controvérsia e exige escrutínio rigoroso da alíquota aventada, imagine-se o desafio de uma reforma que unifique todos os principais tributos incidentes sobre o consumo —PIS, Cofins e IPI, federais, o ICMS, estadual, e o ISS, municipal. Esse, afinal, é o objetivo mais importante das propostas de emenda constitucional que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado (o texto dos senadores inclui mais tributos na unificação). Não bastasse haver um texto em cada Casa legislativa, o governo Jair Bolsonaro tem seus próprios planos. Conforme se noticia, o Executivo pretende encaminhar ainda projetos para a reformulação do Imposto de Renda, que será bem-vinda se promover maior progressividade, e para a desoneração das folhas de pagamento, a ser compensada por um obscuro imposto sobre transações eletrônicas. À exceção desta última invencionice, todos são objetivos meritórios e, na teoria, quase consensuais. Como em toda tentativa de reforma tributária, as dificuldades crescem quando se desce aos detalhes. Muita tinta será gasta no debate em torno do melhor modelo e da melhor estratégia política. Importa que se caminhe, mesmo em passos pequenos, na direção correta. (Editorial da Folha de São Paulo-21.07.2020). – Fonte: Fundação Perseu Abramo

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