O FMI (Fundo Monetário Internacional) estima que a recuperação econômica pós-pandemia já será uma realidade em 2021. A projeção é de um crescimento global da ordem de 6% para esse ano e de 4,4% para 2022. A previsão leva em conta o relativo controle da pandemia. Atualmente, 22% da população mundial já está vacinada, número que é muito maior em países como Reino Unido (91%), Estados Unidos (87%), União Europeia (51%) e China (38%). Enquanto isso, por aqui, temos cerca de 30% da população vacinada com ao menos a primeira dose e um cenário desafiador. Para ajudar a compreender o momento e as implicações na economia, o Banco Ourinvest realizou uma coletiva de imprensa com três especialistas da instituição renomados em questões econômicas. Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest, Welber Barral, estrategista de Comércio Exterior do Banco Ourinvest, e Cristiane Quartaroli, economista de Câmbio do Banco Ourinvest, conversaram com jornalistas para falar de possíveis cenários e do papel “surreal” do Brasil nesse contexto. Segundo Barral, para entender a situação do Brasil é necessário compreender o contexto internacional. Ele afirma que já há evidências concretas de recuperação em potências como Estados Unidos e China. “Nas últimas semanas, houve divulgação de dados positivos. Ainda que tenham ficado um pouco aquém do esperado, os sinais são importantes e apontam para uma recuperação econômica global”, diz Barral. Enquanto nos Estados Unidos há sinais de que o estímulo econômico ainda será necessário por um tempo e que, por isso, a taxa de juros poderá ser revisada, na China, nosso principal parceiro comercial, a economia deve crescer 8% esse ano. “Isso acaba mantendo alto o preço das commodities e é uma boa notícia para o cenário de exportação do Brasil”, explica Barral. Por outro lado, ainda há riscos para que as expectativas mais positivas se concretizem. A demora da vacinação nos países emergentes, a recuperação mais lenta dos países europeus, que dependem fortemente da retomada do setor de serviços, e o risco de uma terceira onda global não podem ser descartados. Como o Brasil se posiciona nesse contexto? Segundo Fernanda, depois do caos de 2020, chegamos em 2021com uma recuperação em curso no Brasil. Para ela, no entanto, a questão é saber se o Brasil conseguirá manter o crescimento constante. Ela lembra que no começo da pandemia os indicadores de confiança despencaram por conta da necessidade de isolamento social. As taxas de mobilidade ficaram baixas e a economia arrefeceu. “Nessa segunda onda, o índice de mobilidade permaneceu alto em meio à pandemia e a queda de confiança foi bem menor. Precisamos entender se isso mostra uma resiliência, com empresas atuando em home office e a economia mais habituada com o cenário, ou se não foi praticado o isolamento social com o mesmo rigor nesse momento de crise sanitária”, afirma. De qualquer forma, os dados de atividade econômica são uma boa surpresa e os especialistas do banco acreditam ser possível que o PIB – Produto Interno Bruto) do País cresça 5% esse ano. “Não podemos descartar os desafios conjunturais, a começar sobre como o País está lidando com a pandemia, o atraso na vacinação e uma possível terceira onda. Além disso, temos um calendário de eleições se antecipando, o que dá menos espaço para evolução de reformas”, avalia Fernanda. Para 2022, os especialistas projetam um crescimento de 2% como algo mais factível. “Esse ano, vamos crescer em cima de uma queda em 2020, a base de comparação é baixa. Mas, para 2022, com um esperado controle da pandemia e um cenário mais claro do que está acontecendo com o Brasil, acredito que seja em torno de 2%”, diz a economista-chefe. O surrealismo brasileiro Além das questões práticas, todas as previsões em relação ao Brasil precisam levar em conta alguns componentes surreais, como classificam os especialistas. Isso porque o País tem características muito peculiares. Um exemplo disso é a inflação. “Não se acreditava que seria possível, em um quadro de recessão econômica, ter uma inflação alta. Mas aconteceu aqui e em outros países também”, diz Cristiane. Os índices que medem a inflação, IPCA e IGP-M, subiram muito nos últimos meses por conta do grande impulso fiscal, necessário para ajudar as famílias em tempos de pandemia. E claro que a alta do câmbio também colaborou para a pressão inflacionária, sobretudo do IGP-M. “Mesmo com o Banco Central agindo de forma preventiva, elevando a taxa de juros, a inflação ficou acima do esperado. Acreditamos em um cenário de continuidade no aumento de juros nesse e no próximo ano, pois o quadro de inflação ainda está com uma luz amarela acesa”, explica Cristiane. Ela lembra que o câmbio está em patamar ainda alto e pode contribuir para mais pressão inflacionária. “Além disso, a possibilidade de extensão do auxílio emergencial pode gerar um aumento no consumo e culminar em mais inflação”, diz. Outro ponto de alerta é a questão hídrica, já que a energia elétrica é um item importante na composição dos índices de preço. Uma eventual crise, como está sendo sinalizada, pode trazer ainda mais pressão inflacionária. “A expectativa de crescimento vinda dessa resiliência da economia também pode favorecer um aumento inflacionário. Por mais surreal que seja, mesmo com quadro ainda grave de questão sanitária, podemos ter mais pressão na inflação”, avalia a economista. Câmbio, mais um componente surreal Para Fernanda, o câmbio é um dos ingredientes mais difíceis de se ponderar, afinal são muitos fatores para compor a conta. No Brasil, tudo muda muito rápido. “Estamos em meio ao abre e fecha da economia, CPI para tratar da pandemia, vacinação atrasada, manifestações populares, mensagens e discursos descompassados de autoridades. No final do dia, o Brasil tem a imagem manchada em relação aos investidores”, explica Fernanda. Ela avalia que o apetite do investidor estrangeiro é necessário para o País conseguir ter uma taxa de câmbio mais baixa. “Precisamos de uma boa história para contar. É surreal pensar que mesmo sendo uma das maiores economias emergentes, já estávamos com queda de fluxo de capital ainda antes da pandemia”, diz. Fernanda acredita que mesmo com a imagem do Brasil arranha dano cenário internacional, “deve sobrar um trocado para o País”. “Estamos em um contexto de liquidez no mundo, mas aquele patamar de investimento direto de US$70 milhões antes da pandemia deve demorar a voltar. Estima-se algo entre US$ 45e US$ 55 milhões para esse ano”, diz. Um último fator ajuda a desenhar o surrealismo do câmbio no Brasil: as eleições. Historicamente, em anos de eleições presidenciais há depreciação da moeda local por conta das incertezas. “O ano de 2022, pode ter questões diferentes, mas uma certeza nós temos: a volatilidade ainda existirá. Por isso, o dólar deve ficar acima dos R$ 5”, finaliza a economista-chefe. |