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Por: Marcos Silva Ramos

 

Confesso que desconhecia o termo “embargos infringentes”, mas, seu efeito, sim! Como em Administração estudamos diversos saberes, dentre eles o Direito, procurei em meus apontamentos – elaborados ao longo dos 35 anos de carreira – um paralelo da ação embargos infringentes com as práticas da Administração. Isto é importante na medida em que, a meu ver, o Brasil defronta-se com uma crise singular – fora da esfera econômica ou financeira, mas com sérios reflexos nelas – o Brasil enfrenta uma crise de gestão – não comum, mas presente nas organizações que negligenciam os preceitos de governança e resistem ao papel de organizações socialmente responsáveis.

Gestão é a questão central da administração, que tem por essência a convergência de conhecimentos, técnicas e esforços no sentido de maximizar resultados e fundamentar a sustentabilidade das organizações e da sociedade.

Embora no discurso neoliberal de mercado a maximização dos resultados enfatize mais o aspecto financeiro, percebe-se que análise deve ir além desta perspectiva. Entende-se como resultado de uma organização, privada ou púbica, a sua eficiência na aplicação de recursos – materiais, humanos e financeiros – de forma responsável na geração de riqueza. A sustentabilidade integra-se ao processo de gestão na perspectiva de que as ações desenvolvidas, por instituições privadas e públicas na obtenção de seus resultados, contribuam positivamente para a construção de uma sociedade justa.

Considero o momento como de crise, no Brasil contemporâneo, dado a característica presente de “esgotamento do modelo atual” no trato da coisa pública – patente nos reclames da sociedade – tornando-se imperativo “o novo”. Isto fica mais claro se analisarmos na perspectiva do Ciclo PDCA, o qual preconiza o processo de Melhoria Contínua e concebe o Ponto de Ruptura quando o sistema não permite mais a Melhoria Contínua, tornando-se mister a adoção de nova tecnologia, ou “modus operandi”, que altera todo o processo, elevando-o à categoria superior, de melhor qualidade.

Assim colocado, a gestão de processos contribui significativamente para compreensão do momento, mas não explica os embargos infringentes, os quais pertencem ao campo do Regimento Interno do STF, conforme Carta Capital: “ao analisar a natureza dos embargos infringentes, Celso de Mello lembrou que todos os regimentos internos do STF previam este tipo de recurso, “notadamente aqueles a partir de 1909, 1940, 1970 e o atual, de 1980” e que o governo tentou acabar com este recurso, o que foi rejeitado pelo Congresso em lei de 1990” 1.

Considerando ser a prática dos embargos infringentes procedimento interno da instituição, e que nesta condição, em Administração, recaímos sobre a Teoria da Decisão, mais especificamente à prática das reuniões para a tomada de decisão, passa a ser este o nosso campo de análise – o que me parece similar às sessões do STF.

A tomada de decisão individual é algo específico dos atores envolvidos, ao considerarmos a percepção como fator interveniente predominante de análise no processo decisório. Neste sentido podemos entender por que as pessoas, diante de um mesmo fato, apresentam interpretações e pontos de vista distintos – no jargão popular: uma coisa é o fato, outra coisa é a percepção do fato (questão tão bem explorada pelas agências de publicidade para construir uma “realidade”).

Quando em grupo, a tomada de decisão considera outras variáveis, como os conflitos internos criados – ou passíveis de ocorrência – e a pressão para a conformidade, fato desencadeador do fenômeno denominado “pensamento coletivo”. Assim, constrói-se uma “nova realidade”, fazendo com que as pessoas alterem seu ponto de vista, seja por crença, identificação com o expositor da nova realidade, por pressões do ambiente, ou até mesmo por comodismo.

Em país democrático, como se pensa o Brasil 2, é de se esperar que as decisões sejam valorizadas quando tomadas em grupo e passíveis de ampla revisão – como se fossem estes os fatores que dão qualidade e retidão à decisão.

O ambiente no qual tais práticas ocorrem é denominado reunião, cuja crença popular considera que “quanto mais cabeças pensando melhor”, o que não encontra respaldo na bibliografia sobre o tema, a qual impõe, ainda, como condição para sua eficácia, regras pré-definidas para seu desenvolvimento e evidências para conclusão, destacando que toda tomada de decisão apresenta riscos. Ainda sobre este assunto, vale uma consulta a Robbins 3 para verificação dos vieses.

Na esfera privada, por exemplo, já vivenciei reunião que foi marcada para agendar uma data para reunir as mesmas pessoas novamente, a fim de decidirem sobre o assunto ali apresentado. (?) Na esfera pública participei de maçantes reuniões que dado novos entrantes e o excessivo número de participantes, eram longas e repetidas inúmeras vezes para que todos pudessem se manifestar de forma livre (às vezes até mesmo fora do tema proposto).

Há de se considerar também os resultados das reuniões: como são divulgados e de que forma as ações serão desenvolvidas. A Teoria da Mudança, que analisa como as pessoas se comportam perante estes processos, esclarece sobre a importância da estratégia de comunicação dos fatos. Aqui, penso, o STF subestimou a percepção do fato pela opinião pública, conforme noticiado por El Pais: En un momento de incertezas y de convulsión social, la celebración de un nuevo juicio representa un motivo más para que millones de brasileños vuelvan a salir a la calle 4.

Reverencio o decano, ministro Celso de Mello, pela postura ética e convicta com que se portou durante todo o julgamento de la mayor trama de corrupción de la historia democrática de Brasil 5, transmitindo para a nação tranquilidade e segurança, dando-nos a esperança de que a justiça será feita na “quantidade” certa para cada um, sem exceções.

Como “Plano B”, resta-nos o consolo nas palavras do Papa João Paulo II 6: summum ius, summa iniuria (a lei é a maior injustiça).

 

1. http://www.cartacapital.com.br/politica/por-6-a-5-stf-acataembargos- infringentes-3449.html – acesso em 21.09.2013

2. “Democracia neste país é relativa, mas corrupção é absoluta.” Paulo Brossard, então senador da República, em 1978 – http://veja.abril.com. br/especiais/veja_40anos/p_092.html, acesso em 21.09.2013

3. ROBBINS, Stephen P. Comportamento Organizacional. São Paulo: Prentice Hall, 2008.

4. http://internacional.elpais.com/internacional/2013/09/19/actualidad/1379563180_454654.html – acesso em 21.03.2013

5. http://internacional.elpais.com/internacional/2013/09/19/actualidad/1379563180_454654.html – acesso em 21.09.2013

6. Igreja Católica, Papa, João Paulo II. Encíclicas de João Paulo II. São Paulo: Paulus, 2006; pg 134.

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